#39 ZWEIG, Stefan - Vinte e Quatro Horas na Vida de Uma Mulher
Sinopse: «Não acha então desprezível ou repugnante que uma mulher deixe o seu marido e as suas crianças para ir atrás de um homem qualquer, a respeito do qual ainda não me é de modo algum possível saber se é digno do seu amor? É realmente capaz de perdoar a uma mulher um comportamento tão negligente e leviano, que todavia não é miúda nenhuma e que, tendo em atenção as suas próprias crianças, já deveria ter sido ensinada a respeitar-se a si própria?»A rotina de um hotel na Riviera é abalada por uma notícia escandalosa. Uma mulher abandona o marido e as duas filhas, em nome de uma paixão por um jovem que havia acabado de conhecer. Este episódio despoleta uma acesa discussão entre os hóspedes do hotel e leva a Senhora C., uma aristocrata inglesa de sessenta e sete anos, a recordar um episódio secreto da sua vida que a tortura há mais de duas décadas.
Vinte e quatro horas na vida de uma mulher é um relato apaixonante e intimista sobre a vida de uma mulher que se liberta das correntes do pudor e do preconceito social em nome de uma paixão avassaladora.
O escritor austríaco Stefan Zweig leva-nos, com a sua habitual mestria, numa viagem ao mundo tortuoso dos sentimentos humanos e das suas incongruências.
Opinião: É a segunda obra que leio do Stefan Zweig, e eu sabia bem que um homem (um homem que escapou à Áustria sob ocupação nazi para se ir suicidar no Brasil devido "à má natureza da humanidade") que escreveu o "Carta de Uma Desconhecida", não poderia ter feito pior trabalho com este pequeno livrinho de 98 páginas que é, na realidade, todo ele uma confissão. A confissão de uma senhora de quase setenta anos a propósito daquele episódio, de há três décadas atrás, no qual quase pôs toda a sua vida para trás, no qual arriscou tudo (e ia perdendo tudo) por um rapaz que acabara de conhecer e a quem quis, por todos os meios, salvar.
Tal como o "Carta de Uma Desconhecida", este romance do Zweig é perturbadoramente compreensível, comovente. Invade-nos, tinge-nos a pele e suga-nos o ar e deixa-nos na boca um sabor amargo; um travo de desalento, de desconcerto, de absurdo. Nem todos os autores conseguem mexer comigo desse modo - a prova disso é que, neste mesmo fim-de-semana, li outros dois livros, um de autor português e outro de autor japonês (o primeiro vencedor do prémio Leya 2011 e o segundo vencedor do Nobel da literatura de 1968) e nenhum dos dois (com a sua soma de 370 e tal páginas), me fez sentir metade do que a confissão da Srª C., nestas poucas folhas, fez.
Aconselho a homens que queiram reflectir sobre o talento deste autor e as camadas profundas do coração - e dos afectos - das mulheres que, quando dadas a cem por cento, apenas retrocedem perante uma traição imperdoável, uma velhacaria que risque o quadro por completo. Aconselho ainda a todas as mulheres que queiram rever-se nos ímpetos, nos impulsos, no sentir e na vergonha da Srª C., que julgou que a sua vida poderia recomeçar aos 40 anos, se ao menos ela fosse capaz de arriscar...
Classificação: 4****