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Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

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Em torno das minhas leituras!

#23 As Cinquenta Sombras Mais Negras

Título oficial: Fifty Shades Darker @ 2017
Realizador: James Foley
Actores principais: Dakota Johnson, Jamie Dornan, Kim Basigner

Classificação IMDb: 4,9
 Minha classificação: 2

No Dia dos Namorados, decidi cultivar o meu ladomasoquista e, numa de desportiva, fui com uma amiga ao cinema ver “As CinquentaSombras mais Negras”. O primeiro tinha oferecido bastante material pararisadas, e a minha única expectativa quanto ao filme é que pudesse rir-me doridículo. Começo logo a rir-me pela tradução portuguesa da coisa, que lhe roupa o sentido, se é que tem algum...
De salientar que nunca tinha lido os livros (li apenas 30 páginas doprimeiro, por ser tão mau que o meu cérebro se recusou a prosseguir). Já a ver “Crepúsculo”– outra vez o meu lado masoquista –, o meu cérebro vai ameaçando desligar-se,tipo corte eléctrico. Sofre assim uns apagões e tal, mas ao menos conseguia irlendo as falas sem encontrar defeitos em todas as palavras. Mas nunca me tinha acontecido, durante uma sessão de cinema, sentir-me a ponto de explodir por não poder assinalar todas as absurdidades, e por as minhas pernas terem quase vida própria e quererem sair dali. Felizmente fui com a melhor das companhias, e apesar de sermos as duas mais odiadas da sala - devido às risadas, aos suspiros, aos "oh my God", "ridiculous" e etc., pude respirar a meio da película e despejar na língua inglesa o mal que aquilo me estava a fazer à saúde. Depois mentalizei-me que era só mais uma horinha, e que se estivesse com cólica renal seria pior, e lá assisti à segunda parte também.

Que fenómeno é este que encheu, ontem às 21:40, asala 2 de cinema do Almada Fórum? Fileiras inteiras de mulheres de todas asidades e casais jovens pejavam o cinema de uma ponta a outra, até a Primark estava vazia ontem, porque 70%do público-alvo estava de bilhete em punho dois andares acima. Seis anos depoisde sair o primeiro livro, continuo sem resposta.

Dakota Johnsoncontinua embaraçosamente má no seu papel. Eu entendo, não é fácil ler aquelassaídas “Sim, aceito jantar contigo, mas só porque estou com fome”, ou gaguejara cada três linhas, ou gemer a cada duas, ou soltar gritinhos de surpresa acada vez que muda de direcção ao caminhar. 

JamieDornan está bem melhor neste filme, parece que conseguiu ultrapassar opouco à-vontade do primeiro (arrumando falas como “eu não faço amor, eu fodo àbruta”), mas ainda assim teve de passar por dois momentos em que teriam de mepagar muito bem como actriz: o primeiro ao fingir que está a ter pesadelos, a rebolar-se nos lençóis e a gritar “não”, de modo a quea sua cara-metade venha consolá-lo a meio da noite. Só expliquei em queconsiste a cena porque nunca viram isso em lado nenhum. O segundo é quando é obrigadoa debitar estas palavras: “tu ensinaste-me a foder, ela ensinou-me a amar”. De salientar que também está bem melhorfisicamente, é da barba. Está mais confortável no personagem e acaba por ser aúnica coisa menos má do filme, basta imaginarem aquele perfil a dizer-vos ao ouvido“tira as cuecas”, e acabou-se. Está comprado, vamos todas ver o filme. Foi maisou menos isso que aconteceu. Só que não… até isso se dilui no dilúvio deestupidez. Quando o filme começava a aleijar-me demasiado, punha a vista nele e ligava o piloto automático, e lá aguentava até à próxima panorâmica de Seattle.
É do livro, entende-se à terceira linha. É aescritora que não tem talento, pertinência, tacto, substância, profundidade. Acreditoplenamente nela quando diz que ia escrevendo o livro no seu Blackberry, porque a preguiça está lá equalquer pessoa sabe como se tem de abreviar a lista de compras quando usamos obloco de notas do telemóvel. Podia ter podido a coisa depois, mas pareceque não se deu ao trabalho.

A ideia do ciúme e da posse levados ao extremo éperigosa. A ideia de que uma mulher possa virar as costas a compromissos detrabalho porque o namorado tem ciúmes do seu chefe, pior ainda. E que aescritora acabe por mostrar que o namorado tinha motivos (quando nenhum tinhasido apresentado) para desconfiar do chefe *porque o chefe acaba por se atirarà rapariga* é a gota de água. O facto de este sétimo sentido do Grey acerca dequem quer comer a sua namorada desinteressante, se provar assertivo é um livrepasse para que os homens deem ordens às mulheres sob o pretexto do “vais ver,acredita em mim”. Não sendo linear, porque conheço inúmeras mulheresinteligentes, independentes e capazes, mas não são elas as que metem um dia defolga para ir ver este filme. E essas não se sabem proteger, e os homens aolado delas, ao ouvido dos quais elas explicavam que ele tem um trauma deinfância (que ninguém que não tenha lido o livro entende – como eu), começam aachar que como as mães lhes bateram com a concha da sopa, agora podem usar-sede violência para com as namoradas, porque elas estavam ali a rir-se, a torceras pernas e a soltar longos suspiros enquanto o Grey aplica umas palmadas bemenergéticas nas nádegas da Miss Steele. Para quem nada entende do franchising, há palmadas e palmadas. E estasnão são do tipo palmadita, são mais do tipo que a pessoa não se consegue sentarno dia seguinte.

Supondo que o cinema e as artes não influenciam assimtanto as pessoas, e que a cena da manteiga em "O Último Tango de Paris" não impulsionou a prática de sexo anal, ficamossó com uma história estúpida, vazia e cheia de incongruências. Uma escritapreguiçosa e desinspirada, em que cada conflito é uma preparação para a cena desexo seguinte, e em que o protagonista é dono do mundo, viaja em colunas decarros para ir a uma festinha em casa da mãe, refugia-se num barco quando achaque a casa está a ser ameaçada e mantém dossiers acerca de todas as gajas comquem privou. Uma história impossível sobre um homem que compra a empresa onde anamorada trabalha, só porque é maluco, e em que lhe enfia dinheiro pela goelaabaixo, quer ela queira, quer não. E ela, claro está, não quer.

De tudo o que me irritou nisto das CinquentaSombras de $, o pior é a fingida aura de sucesso e de independência daprotagonista, sendo que toda a gente a aborda para lhe dizer que o Christiangosta de mandar e que as mulheres lhe sejam submissas, e que ela não é o tipode mulher que se deixa controlar. Certo. Elanão é o tipo de mulher que se deixa controlar. Quando, nestas quase trêshoras de dois filmes assistidos, é que a personagem feminina tomou umainiciativa? Fez uma pergunta pertinente? Tomou uma decisão? Uma mulher quedeixa de cumprir compromissos de trabalho por ordem do namorado, que dá doisminutos de luta só para não ser demasiado óbvio que é unidimensional, paradepois ceder sempre? Ah, está bem. No fim do primeiro, quando ele a espanca eela lhe diz que aquilo não é para ela. (Porém, contudo, no seguimento…) Deresto, da pouca vida que E.L. James soprou a esta personagem, só lhe restagaguejar e falar para dentro, por sorte com toda a gente ao redor muito interessadaem escutar o que ela tem a dizer. Nunca a expressão “mosquinha morta” seaplicou melhor.

Por último a questão do ardente, escaldante,alucinante, inigualável sexo entre as personagens principais…

O que vejo é uma história escrita por mulheres e paramulheres, em que o homem cumpre as suas fantasias, certo, mas visualmente o quese vê, o que se ouve, o que se respira são as fantasias de uma mulher. Engraçado que a câmara, como é hábito, esteja focada no corpo feminino, mas é um erro de marketing. O olhar deste lado é de mulheres, pelo que surge assim mais uma coisa para corrigirem. Entendo que depois de um século a explorarem o corpo das mulheres no cinema, a favor dos homens, agora tenham de admitir que as mulheres também têm dinheiro no bolso para gastar, por isso basta mudarem a câmara das pernas da Anastasia para os abdominais do Jamie Dornan, como na cena em que ele está a fazer ginástica em casa, para verem o que são as gajas a gritar mais alto ainda
E em que consistem essas fantasias de mulher que o Mr. Grey cumpre com tanto entusiasmo? São as de umhomem que tome iniciativa, que se mexa, que paire acima dela, que lhe dê ordens(geralmente relacionadas com a roupa interior dela, não com a sua carreira), que mostre que a deseja,que se aplique em dar-lhe prazer. Pelo menos pelo filme, não parece que a Steele dê grande retorno ao pobre homem. Uma vez mais, a sua falta de iniciativa a impor-se, e também nunca a vemos empenhada em satisfazê-lo a ele. Neste sentido, não me parece que os casais possam beneficiar muito desta promessa de sexo fantabulástico. Se a mulher não se mexer, e se o homem for como muitos, à espera de ser atendidos, não me parece que as brincadeiras vão muito longe, pelo menos sob o signo das Cinquenta Sombras. Lá está: escrito por mulheres e para mulheres, num universo onírico em que o homem não busca nada e dá tudo, ou, mais perfeito ainda, em que o homem descobre nos gemidos (ainda que de dor) da mulher a sua própria satisfação, e não precisa de mais nada.

Há coisas que sinceramente preferia nãosaber do universo íntimo destes dois personagens monocromáticos. É que isto não é bem pornografia, mas também não é bem a típica história“rapaz conhece rapariga”, e por várias vezes pensei “já estou a saber demais”. Nãoquero saber em que posições eles fazem sexo – o que é esquisito, porque oassunto interessa-me. Eles é que não. Este casal tão pouco nítido, emnada palpáveis, nem através da prometida quebra detabus ganha cor. Fica por ali, fora da sala de cinema, sem alma nem contornosreais. Como o meu cérebro, que também se recusou a entrar na sala e que só me voltoua falar hoje de manhã.
A cada vez que ele dizia que aquela casa também era dele, e a outra propriedade, e as jóias, e os carros, e as empresas, só me perguntava como tudo isto, esta inverosimilhança flagrante, pode apelar a todas as raparigas que estavam sentadas na sala de cinema, e como os seus homens, quem sabe de ordenado mínimo em carteira, podem sentir-se excitados perante uma história de um tipo novo, bom de cama e podre de rico, que faz o que quer de uma miúda descompensada. 

Para entenderem o quão má a coisa é, deixo uma listade inconsistências. Só não escrevo mais porque não estou desempregada:
Portanto atenção spoiler alert:
- A rapariga passa a vida metida na casa dele, mas quandovai a casa para buscar algumas coisas, é na escova de dentes que pega – porca!
- Há uma antiga submissa do Grey à solta, apostada emassassinar a sonsinha de serviço, e apesar de ser uma pessoa frágil e desequilibrada,consegue infiltrar-se na garagem do Grey, cuja casa é tipo uma fortaleza, masnunca explicam como;
- Quanto à mesma rapariga, o Grey diz que tem “o seupessoal” em cima do acontecimento para a encontrar, mas a rapariga entra nacasa da Anastasia na boa – sem chave, sem arrombar a porta, sem partir uma janela,para vê-los dormir. Como? Fica por nossa conta.
- Ainda quanto à mesma rapariga, que é o grandeconflito e suspense do filme, o pessoal do Grey continua em cima dela, mas umavez mais ela entra tranquilamente na casa da Anastasia, sem que se saiba comoposto que não há nada arrombado nem fora do sítio, para a surpreender com outradas suas inspirações. Acham que nos explicariam porquê? Que se lixe a lógica;
- O matulão despenca-se com grande aparato num helicópteroacompanhado de uma assistente (julgo), acham que morre? Não, primeiro ésocorrido não se sabe por quem, faz todo o caminho de Portland para Seattle nãose sabe como, chega todo desgrenhado a casa sem que uma equipa de socorrostenha notificado a família de que está inteiro, e apresenta-se em casa a dizerque perdeu o telemóvel e por isso não pode ligar, enquanto a televisão notificaa sua provável morte e a família chora reunida;
- Acham que, no seguimento do acidente, o homem foidescansar e quem sabe reflectir sobre a vida? Não, foi fazer aquilo que pagámospara vê-lo fazer;
- Acham que uma pessoa com sangue na fronte vai aohospital ou fica em repouso? Nope, otodo-poderoso Grey vai à sua festa de aniversário, com direito a foguetes, e aempregada que se despencou com ele está lá, sem uma entorsezita que seja;
- Christian Grey, com tantas empresas einvestimentos, que toca piano e pilota helicópteros e barcos, que viveu umavida de horror e traumas que o marcaram para sempre, tem que idade? Este bilionário(milionário está fora de moda, a E.L. James quis fazer tudo em grande) que nomeio de todo o seu sucesso ainda tem tempo para dar uns tautaus às moças comchicotes e fivelas e coleiras na sua sala vermelha, tem que idade, vá? Umpalpite? Trinta e cinco, como eu pensava? Não, não, senhores. Tem vinte e sete.Now deal with it;
- Está sempre lua cheia em Seattle, espero que a NASAjá esteja em cima do acontecimento.

Para terminar, concordo com o anónimo – estou avarrer a internet à procura dessa crítica, mas não encontro –, que diz que acoisa mais profunda sobre o filme são o cordão de bolas metálicas que aAnastasia Steele usa. Agora deixo-vos a reflectir onde.

#21 The Shining

Título oficial: The Shining @ 1980
Realizador: Stanley Kubrick
Actores principais: Jack Nicholson, Shelley Duvall
Classificação IMDb: 8,4
 Minha classificação: 4

Baseado no livrode Stephen King, “The Shining”, ou “O Iluminado”, em português, prometia ser umfilme de terror de arrepiar os cabelos. Prometia ser um dos melhores filmes detodos os tempos, dentro do seu género e para além dele. Eu tenho medo de filmesde terror, não assisti a muitos por esse motivo. Mas acho que não devo deixarque os meus gostos ou limitações influenciem, a cem por centro, a minha culturageral. Então achei que estava na hora de superar o desafio de ver este filme.
Porém, quando aeste, senti sobretudo embaraço. Ao longo das duas horas e vinte minutos em queo filme roda, procurei constantemente um sentido para o enredo, um escalar parao prometido clímax, um fio condutor que me permitisse extrair alguma lógica atudo isto. Nunca encontrei nada por onde pegar. A actuação da Shelley Duvall constrangiu-me. Não vale a penacontra-argumentar-se que o problema está no facto de o filme ter sido rodado hátrinta e seis anos: o problema é ela ser má actriz. A Vivien Leigh, em 1939,era muito melhor. A Bette Davis, em 1942, era muito melhor. Portanto, é tão máactriz que o filme se estraga logo aos primeiros minutos, quando ela está a rire a debitar frases como se as estivesse realmente a ler, a partir do guião. Opróprio guião é mau – alguém deve ter recebido muito para o adaptar do livro,mas esqueceu-se de criar a ponte “literatura-cinema”, pelo que as falas galgamesse espaço e vêm estatelar-se no chão. Sobretudo as da Wendy (Duvall), esobretudo no início, depois acabam por entrar no campo do “normal” para a épocae para o género. Houve um momento em que entendi que tinha de parar de culpar aactriz pela disfuncionalidade do seu papel. O que lhe foi pedido também é parvopor si só. Não entendo como não venceu na categoria de Pior Actriz dos Razzies, para a qual foinomeada.  
Ultrapassandoesse problema, penso que a criança, Danny (Danny Loyd) teve uma óptimaprestação no filme, contribuiu para nos puxar par ao ambiente lúgrube do Overlook Hotel - e na minha óptica o hotel é ovilão, e o ambiente do hotel é o elemento mórbido que acaba por ser oprotagonista do filme -,ver aquele cenário pelos olhos dele é intimidante. E o Jack Nicholson, claro, pareceter sido feito para representar este papel. O rosto dele mexe mais com oespectador do que o chorrillho de disparates das falas. "Assinei umcontrato" - *eye roll*, scary.
Se calhar oproblema é que, tendo o filme nascido de um livro, procurei nervuras queexplicassem o que sucede. Por muito que não haja explicação para tudo, e nomundo do horror e do sobrenatural menos ainda. Se me focasse apenas na bandasonora, nos pormenores que nos desconcertam e inquietam (como a cena em que acriança galga tapetes/soalho em sequência com o triciclo, e o ruído mexe comtodos os nervos do nosso corpo), ficaria híper impressionada. 

De facto há umaadmirável visão, inquietante, por detrás de todo o projecto. Alguém que soubecaptar os ângulos, plantar receios, criar ansiedade. Porém sinto que faltaalma, um mal identificado, um mal localizado, um mal com cabeça tronco emembros. O hotel, por si só, é arrepiante. Mas fora isso… como se explica tantacoisa? Gosto de respostas. Inquietarsó porque sim acaba por cair no esquecimento, para mim. Creio que este filme,assinado por um realizador menos mediático, estaria na lista dos maioresdisparates de sempre. Fico feliz de ter visto o filme, mas não entrei para oseu clube de fãs nem creio que volte a vê-lo um dia.

Classificação: 4/10

#20 | 50 Sombras de Grey

Títulooficial: Fifty Shades of Grey @ 2014
Realizador: Sam Taylor-Johnson
Actores principais: Dakota Johnson, JamieDorman
ClassificaçãoIMDb: 4,3
 Minhaclassificação: 2,5

Este é o espaço onde partilho opiniões sobre filmes que gostei/não gostei. Sóposto os que considero dignos de serem mencionados, para o bem e para o mal.Não faço disto um diário da minha vida filmográfica. Para poder falar por fimcom conhecimento de causa, submeti-me a duas horas de Fifty Shades ofGrey, apenas para concluir que o panorama geral é ainda pior do que euimaginava. Senti que, à parte da banda sonora, nada funcionou no filme.Partindo de um livro tão pobre, a Sam Taylor-Johnson não tinha muito por ondese virar. Mesmo porque é sabido que a própria E.L. James não deixou de darpalpites sobre o filme. Isso transparece: a pressão posta em cima do filme,para que funcionasse, e dos actores, para que tornassem credíveis diálogosembaraçosos, de tão absurdos, é evidente.Tive pena do Jamie Dornan, que éacusado de ser mau actor neste filme, por não saber pôr mais afinco naschicotadas que dá à princesinha Steele. Também, ao contrário do que já tenhoouvido dizer, tenho pena da Dakota Johnson. Parece-me uma menina doce e até umtanto tímida, o que a terá tornado a pessoa ideal para assumir o papel dacabeça-oca da Anastasia Steele. Porém, a estupidez é tamanha que acaba porprejudicá-la também. Como ser-se bom actor com uma pobreza de argumento destas?Eue a minha irmã assistimos à versão não-explícita do filme juntas. Agora virem acara porque vão chover spoilers:a) Foram inúmeros os silênciosincómodos que nos obrigaram a soltar risos;b) O filme começa muito mal mesmo,com as incongruências a atropelarem-se umas às outras. Desde os lugares semprelivres à porta do edifício do Grey, ao lugar livre à porta da loja onde elafunciona, à química inexistente entre os actores.c) As personagens sãouni-dimensionais, do género que povoavam os meus rascunhos de aspirante aescritora na tenra adolescência. Nessa altura a melhor amiga só serviapara ser inconveniente e nos lembrar que estávamos apaixonadas por fulano taloirmão do nosso namorado era o par perfeito para a melhor amiga/irmã solteiraamãe estava convenientemente afastada para dar uma mobilidade facilitada à jovemheroína, que com a mãe à perna não se poderia meter em aventuras. Orapaz principal era sempre muito novo, muito rico, muito perturbado com ainfância e havia sempre um traço físico que fazia com que isso viesse à baila:uma cicatriz no sobrolho, uma queimadura no braço. E poderia continuar para sempre.


b) Falastipo "I don't make love, I fuck hard", ou "I want to fuck you inthe middle of next week", ou "I don't do romance", ou "Likewhere you keep your Xbox?" ou "This is my red room of pain" orame punham a rir, ora me embaraçavam. Tive genuína pena dos actores e nãoentendo como se submeteram a tamanho flop nas suas carreiras.
c) Ele nãoé controlador, ele é doente. Há umadiferença. O Moisés, que assassinou a ex-mulher (Carla Santos) depois de anos asegui-la e a espiolhar-lhe a vida toda, não era controlador, era doente.Apanhou 20 anos de prisão.
E tudo deveter começado assim...
d) Da segundavez que o casal maravilha se vê (se não fosse a óbvia pressão para o JamieDornan olhar a moça e dizer "I am looking [at you] eu não adivinharia quevinha aí um relacionamento entre duas pessoas, e ficaria à espera da"faísca", que nunca vem) eu ainda não sentia qualquer conexão entreos dois protagonistas. Contudo, o Mr. Grey já tinha a mioleira a fervilhar, ejá lhe estava a perguntar quem era o fotógrafo e o patrão, e etc., etc. Eu e aminha irmã olhámos uma para a outra e gritámos: FOGE! 
e) Poucodepois, na embaraçosa cena em que ela lhe liga, bêbeda, já ele assumiu que épai dela (sem beijo, sem qualquer romance a insinuar-se). E não é um paiqualquer, é um pai com direito a palmadas, então adivinha onde ela está (ofilme não se importa de explicar, assume que todos os que foram assistir tirarama quarta classe para poder ler o livro), e vai atrás dela. Numa cena nadaencenada, onde prima a naturalidade com que os acontecimentos se intercalam,durante a película, o amigo dela (porque não um estranho???) está a tentarbeijá-la. Que conveniente para que ele venha salvá-la! Awwww!
f) O filme é umcliché pegado, polvilhado do mau gosto aterrador que creio que seja a essênciado livro. Para alguém que não saiba o que está por detrás de tudo isto, e queveja o filme como coisa independente e tente daí extrair algo, o que vê? Umarapariga desastrada, intimidada pelo homem muito rico (ah, ela é virgem!),que ao  longo do filme exibe a sua riqueza com uma garagem cheia decarros, uma enorme colecção de gravatas, um helicóptero privado, um apartamentogrande onde tudo reluz e não há qualquer marca de personalidade, um paraleloóbvio com o "vazio" da vida do Grey antes de conhecer a Steele, umpiano que ele toca (composição mais óbvia não há, reconheci-a de imediato),programas fora do comum. Em 1990 já havia um filme igual: chamava-sePretty Woman, mas de algum modo o Richard Gere tratou a prostituta melhordo que o Mr. Grey, e a Vivian (Julia Roberts) tem mais amor-próprio e dignidadeque a virgem deste filme.
g) A talideia da BDSM só é absurda (e nunca revolucionária, e muito menos o sexo érevolucionário neste filme, se quiserem dou-vos uma lista de bons filmes quemetem cenas de sexo, ou mesmo livros) na medida em que ela é uma ignorante quenão faz ideia de onde se está a meter. Não basta ele querer decidir tudo arespeito da sua vida, o que lhe anula o livre arbítrio e a torna uma sombradoutrem, ainda quer agredi-la e magoá-la fisicamente. Preferia nãoter sabido de nada disto. Só consigo imaginar as mamãs a mascararem-se e aporem-se a jeito para os maridos lhes darem umas palmadas nas nádegas. Queelas pediram (ok, ao menos isso, ao contrário do filme). Acho muitobem que as pessoas sejam abertas quanto à sua sexualidade, dialoguem e atélevem palmadas ou lhes façam chichi em cima, se é a cena delas. Mas de repentemeterem palas nos olhos por causa dum livro miseralmente escrito, equipararem asituação a uma revolução sexual e esgotarem as prateleiras de tampões anais dassex shops internacionais já me assusta um bocado... Então foi preciso queviesse esta cegueira para descobrirem que tinham rabo? Foi preciso o FiftyShades para que se dessem conta que há gente que gosta de pôr trela elevar açoites? E de repente já está tudo bem, porque é disso que fala o únicolivro que leram na vida? Absurdo. Hipocrisia total.
h) Naparte em que ela se inclina e ele lhe aplica seis valentes açoites com um cintode couro no rabo, experimentei uma estranha satisfação. Uma parte de mim dizia"Vêm? Vêm como a mulher fica numa posição que a rebaixa e, quer queiraquer não, há pouca igualdade nesta situação? Vêm que dói e que até a atrasadamental da Steele entendeu que ele é doente mental por procurar arrastar umapessoa como ela para um mundo que só ele domina (e é dominador, foi sem querer,este twist)?" E pensei: OK, ela aprendeu. Mas não, ela nãoaprendeu, porque vêm aí mais dois filmes. Suponho que, a dado momento, elavolte a agachar-se para ele a sovar.
i) Sabem em quepensei, enquanto o Jamie Dorman expelia o ar dos pulmões para transmitir asensação de alívio que esta personagem mal enjorcada da E.L. James conformedescia o cinto nas nádegas da pobre burrinha? Que há tanta beleza num homem quecuida, que se preocupa, que seria incapaz de nos magoar, fosse como fosse, eque se odiaria se nos causasse qualquer espécie de dissabor...

Este Grey éo oposto daquilo que um homem deve ser, na minha opinião de jovem de 25 anos,solteira, que se calhar vai passar a vida toda à espera que um grande amor mearrebate. E isto é o oposto da história da Cinderela. É-me chocante que sejam as mulheres as principais consumidorasdeste produto de caca. É-me chocante que uma mulher absolutamente medíocre comoa E.L.James tenha o nome sabido em todas as tascas por causa de um livro quecomeçou doutro tão mau ou pior, e que evoluiu para este histerismo colectivo einfundado. Uma britânica que escreve sobre americanos com expressõesbritânicas. Uma mulher que não sabe escrever, nem tem imaginação, nem sabe doque fala.

Enfim, é o mundo que temos.
E outras E.L. James virão, porque o povão está aí para papare adorar.

Que fique claro que não lhe dei 1€ seja com os livros, seja com ofilme.

#18 & #19 Still Alice & We Need to Talk About Kevin

Título oficial: Still Alice @ 2014
Realizador: Richard Glatzer, Wash Westmoreland
Actores principais: Julianne Moore, Alec Baldwick, Kristen Stewart
Premiações: Óscar de Melhor Actriz para Julienne Moore
Classificação IMDb: 7,5
 Minha classificação: 7


Baseado no romance homónimo de Lisa Genova, "Still Alice", ou "O Meu Nome é Alice", em Português, é uma ficção que me encontrou por ter o Alzheimer como tema central. A minha bisavó padeceu dessa doença, o meu primeiro romance publicado girou em torno dela, e por fim uma Julianne Moore lindíssima e super competente dá vida a esta Alice. Devo dizer que o filme foi mais uma espécie de close-up do que é a vida de alguém que sofre dessa doença, que implica a degeneração das células da memória funcional, do que um grande apanhado do assunto. Não se perde em questões médicas, apesar de tanto o marido quanto um dos filhos de Alice praticarem essa profissão. 
O filme apresenta-nos uma mulher de grande tino e elegância, uma Professora universitária de mérito e presença, a definhar aos 50 anos quando começa a sentir-se desorientada e meio "esquecida das coisas"...
Na sua fase mais avançada, o Alzheimer leva a pessoa a esquecer-se de si própria, de quem o rodeia. Faz-se a mesma pergunta inúmeras vezes, é exasperante para quem está ao redor de alguém assim. Além dos queixumes constantes (eu que o dia, além da minha falecida bisavó, também o vizinho do lado passa o dia em "ais"), faltou ao filme mostrar a agressividade que toma os doentes de Alzheimer quando se sentem perdidos e expostos. A determinado momento, tudo se perde: a orientação das ruas, os nomes dos familiares e amigos, a capacidade de executar, até, as tarefas mais simples...
O filme é tocante, não haja dúvida. Até Kristen Stewart, que mantém sempre a mesma expressão impávida, pareceu ter dado mais de si neste drama. A verdade é que o Alzheimer é um teste maior ao amor e à paciência de quem nos rodeia. Do marido que começa por colaborar e depois perde as forças, à filha distante que recusava os conselhos maternais e que se dispõe, em último caso, a cuidar da mãe pessoalmente.
Vale a pena ver, e por isso fiz questão de lhe dedicar algumas palavrinhas aqui.
Título oficial: We Need to Talk about Kevin @ 2011
Realizador: Lynne Ramsay
Actores principais: Tilda Swinton, John C. Reilly, Ezra Miller
Classificação IMDb: 7,5
 Minha classificação: 8,5


Temos de falar sobre Kevin é um dos filmes mais perturbadores a que assisti nos últimos tempos. No final fiquei em silêncio por um bocado, e quem me conhece sabe que não sou de ficar calada. E isto é um filme sobre quê? Na minha opinião, há várias respostas, sendo que a que mais me satisfaz é: o amor materno. O amor materno em todo o seu poder de superação, perdão, regeneração, sacrifício e incondicionalidade. Foi a primeira vez que vi a Tilda Swinton a representar, embora tenha traços que lhe tornam o rosto inesquecível. Fez uma Eva credível, tanto na expressão de insegurança, como de fragilidade emocional (e até psiquiátrica) e de amor. Mas é a intriga e as coisas inconfessáveis que dominam o filme.
O trailer não é muito esclarecedor, pelo que me perguntava se seria um filme de terror. Infelizmente, penso que seja o filme de terror de algumas famílias, pois que casos assim ocorrem, lá isso ocorrem...
O filme fez-me reflectir: 
Em que falha uma mãe?
O que leva alguém a levar sentimentos como raiva contida e ciúme a transformarem-se em algo de maior, algo de letal?
Quanto horror e infelicidade pode um coração materno testemunhar sem colapsar?
O que tem um filho de fazer para que a mãe lhe vire as costas?
Não há modo de me alongar sem referir factos. Contudo, as analepses, os diversos momentos em que Eva nos é apresentada, livre a viajar pelo mundo, apaixonada, como mãe e, mais tarde, aparentemente sozinha no mundo e ostracizada, foram muito bem pensadas. Considerei o filme um trabalho artístico difícil de ultrapassar e de esquecer, de uma beleza trágica que contém tudo o que aprecio num bom filme. Permanece em nós após terminado, como que se nos assombrasse, alertando-nos para questões de difícil resolução e sem qualquer explicação.
Aconselho a todos os que perscrutam a natureza humana sem encontrarem respostas.

#17 Dei-te o Melhor de Mim

Vamosser honestas, Célia? Não vejo os filmes do Nicholas Sparks (nem leio os livros)em busca de uma boa história. Fi-lo quando, aí entre os doze e os catorze anos,comecei a lê-lo. Depois, comecei a fazê-lo só para me torturar. Só porque nãosei que mais faça e às vezes é bom fingir que não cresci e que ainda acreditoque existam homens assim, como ele os pinta.
Então,neste fim-de-semana, e para tentar fugir ao milhão de trabalhos que tenho parafazer, meti-me debaixo da manta, chamei a minha irmã (que é dez anos mais novado que eu mas também dez vezes mais evoluída, e pareceu relutante em ver ofilme) e pusemo-lo. Objectivamente, é o seguinte:

o tipo que faz de jovem Dawson (Luke Bracey) é um gatão e entreteve-me atémetade do filme.
PS - Começo a achar que Um Refúgio para a Vida deve ter sido produzido por outra pessoa enquanto o Nicholas estava em casa com uma valente constipação...
apesar de não ir com a cara da jovem (não me lembro do nome dela, damn!), acho que havia química entre osdois e ela encarava bem a personalidade que emanava.
na minha óptica, não há qualquer química entre os actores que fazem de Dawson eAmanda (googled it!) mais tarde. A Michelle Monaghan parece, simplesmente, sermãe do James Marsden.
Àluz das histórias do Nicholas Sparks(incluindo das suas produções filmográficas, que tanto fogem aos seus própriosenredos mas são todas elas também iguais entre si):
os ingredientes são os mesmos de sempre: rapariga rica, rapaz pobre, interiorda Carolina do Norte, um viúvo, muitos anos de separação, um trabalho perigoso efísico para o moço (bombeiro, trabalhador de petrolífera, soldado noAfeganistão, soldado no Iraque, etc…).
o que varia tem sempre paralelismo com as outras histórias: o outro viúvo eraapegado aos quadros da mulher, o outro era apegado às flores da mulher.
os pais dela nunca gostam dele.
ela faz sempre tudo o que quer do tipo, é ela que decide onde e quando. Ele torce-setodo para a convidar para um encontro, depois leva-a a comer comida local nointerior. Bebe cerveja e ela bebe colalight. No final do encontro ele não sabe se deve beijá-la, mas beijam-seporque é tradição.
há sempre um momento em que ele “tem de deixá-la ir” para provar que a ama.
há sempre um sacrifício que ele faz por ela.
 não faltou a cena do beijo à chuva, nem o "are you sure of this?" quando ele está prestes a tirar a virgindade à mocinha;
( faltou o passeio de barco, fiquei de queixo caído!)
 coincidências inexplicáveis, mortes desnecessárias to add some drama.
em 50% dos finais ela fica sozinha com as cinzas dele, o ex-marido que já nãoama e os filhos que não são dele.  
 as capas são todas iguais.
Gostavade poder dizer que é a última vez que me submeti a tanto cliché, mas a verdadeé que noutro domingo frio, sem nada para fazer, pego na manta e lá vou eu,rir-me mais um bocado da desgraça alheia, que é como quem diz: da dificuldadeque o homem tem em reinventar-se. 

#15 Voando Sobre Um Ninho de Cucos


Título oficial: One Flew Over the Cuckoo's Nest @ 1975Realizador: Milos FormanActores principais: Jack Nickolson, Louise Fletcher, Danny de VitoClassificação IMDb: 8,8Minha classificação: 8,0
"Um Estranho no Ninho", como lhe chamam os brasileiros, é um filme de 1975 baseado noromance de Ken Kesey de 1962. Jack Nickolson apresenta-se como o irreverente"Mac" McMurphy que, acusado de violar uma rapariga de 15 anos, élevado a um hospital psiquiátrico para se avaliar se é doente mental ou umcriminoso comum. 
Apesar de ser um filme comovente, lindíssimo,com muitos assuntos prementes para reflectirmos, o mais importante éentender-se os deslocados. Os tímidos, os dementes, os iludidos, osdesajustados. Uma série de loucos senta-se a jogar às cartas diariamente naenfermaria de um hospital psiquiátrico gerido com punho de ferro pelaenfermeira Mildred Ratched. Uma mulher rígida que aplica técnicas violentas eopressoras para impor a rotina e impedir os doentes de saírem debaixo da suaasa. Mac assume-se de imediato como o chefe dos doentes, tornando-se umadversário à altura de Mildred. O que se segue é um combate entre as técnicasda enfermeira para vergar espíritos e o espírito aparentemente indomável deMac.
Para mim, portuguesa, a grande surpresa foidescobrir (que vergonha só o ter sabido agora) que a horrenda técnica depsiquiatria apelidada de “lobotomia”, que transformou tantos homens emvegetais, foi inventada pelo Português Egaz Moniz, o famoso das faculdades edas ruas, que ganhou o Prémio Nobel da Medicina em 1949 por essa barbaridade.
Tenciono ler mais sobre o assunto, quem sabe atédesbravar a complexidade da Psiquiatria num novo romance. Mas por enquantobasta-me ficar de queixo caído por saber que o pai de Rosemary Kennedy (e J. K.Kennedy) submeteu a filha rebelde, de 23 anos, a esta técnica, condenando-a auma incapacidade permanente para o resto da sua vida.

Filmes em Lista de Espera

Her (2013)
Comecei a vê-lo, acho que sou capaz de compreender essa concepção "abstracta" do amor. Impulsionado pelo fim do seu casamento e pela nova ligação possibilitade entre computador e utilizador, espero encontrar um Joaquin Phoenix introspectivo e comovente.

Sleepless in Seattle (1993)
 
Só porque celebra uma Meg Ryan pré-plásticas e promete ser uma das boas comédias românticas, de banda sonora inesquecível, dos noventas.

Nine 1/2 weeks (1986)
Porque amores perturbados e pessoas perturbadas acabam sempre por me interessar.

Labor Day (2013)
Tem a Kate Winslet e tem um amor improvável. 

Adore (2013)
Inspirado num romance da Nobel Doris Lessing, vejamos se o livro conseguiu mergulhar nas subcamadas do coração humano.

The Spectacular Now (2013)
Porque gosto da capa. E porque me pergunto o que tem esta rapariga de tão especial para andar na berra, porque ainda não a vi em acção...

The Shinning (1980)
Aclamado filme com o bom e velho Jack Nickolson. Só me assusta o facto de o realizador ser o Kubrick.

The Railway Man (2013)
Histórias de amor e guerra? Com o charmoso do Firth em grande plano? Mi piace.

Paris, Texas (1984)
Mulheres muito bonitas e muito perturbadas... e a inspiração para a Paris Texas dos Gotan Project...deal!

 Shame (2011)
Homens muito bonitos e muito perturbados também me interessam.

 Letters from Iwo Jima (2006)
Porque mesmo os americanos admitem que a versão da II Guerra Mundial na voz do Clint Eastwood comoveu mais do ponto de vista japonês.

One Flew Over The Cuckoo's Nest (1975)
A minha mãe diz que é um bom filme. And she knows movies...

#14 La Belle et la Bête

Título oficial: La Belle et la Bête @ 2014
Realizador: Chistophe Gans
Actores principais: Lea Seydoux, Vincent Cassel
Classificação IMDb: 6,4
Minha classificação: 7,8

O conto - ou fábula? - "A Bela e o Monstro" foi para mim, desde sempre, a mais querida das histórias de encantar. Uma mulher cuja bondade transparece nos traços, a imagem da delicadeza (de gestos e de sentimentos), submetida a um monstro e, contra todas as probabilidades, a amá-lo. A ser capaz de amá-lo, porque a capacidade de amar não é coisa que assista a todos.
Este filme, embora com as suas falhas - por exemplo, acho que a relação entre os protagonistas foi demasiado precipitada, e que se perdeu demasiado tempo na sequência do confronto final - é estéticamente lindo. Seja a protagonista, seja o castelo encantado, onde nos é quase possível cheirar as rosas e provar as pêras, sejam os seus vestidos, jóias e toda a magia envolvente.
Isto é uma pequena nota a respeito do filme mais belo - jogando com a palavra beleza visual que vi nos últimos tempos. Todo o filme é um lugar acolhedor para se estar.
Para amantes de grandes amores, do conto intemporal imortalizado por Jeanne Marie Leprince de Beaumont
A França encantada da minha infância...


#13 The Normal Heart

 Título oficial: The Normal Heart @ 2014
Realizador: RyanMurphy
Actores principais: Mark Ruffalo, Taylor Kitsch, Matt Bomer, Julia Roberts
Classificação IMDb: 8,3
Minhaclassificação: 9,0

Apesarde não ter andado com grande apetite para filmes, vi uma frase deste filme queme deu vontade de ir descobrir o trailer. “Man do not naturally not love. Theylearn not to”. Depois do Dallas Buyers Club, que adorei, surge um filme emtorno do mesmo tema. Porém, aqui temos a perspectiva da comunidade nova-iorquinogay. Pessoas com acesso a altoscargos, papéis na imprensa e na saúde, que a partir de 1981 parecem começar a morrerde uma epidemia desconhecida. Um novo tipo de cancro, suspeita-se. Um cancroque apenas ataca os homossexuais. Os pacientes são submetidos a quimioterapia etratamentos experimentais mal financiados, apenas para morrerem desse maldesconhecido. Suspeitam de uma conspiração do governo para acabar com oshomossexuais. O histerismo social eleva-se; é punição pelo pecado dapromiscuidade.

Nestecontexto, temos o jornalista/escritor Ned Weeks (Mark Ruffalo), judeu, aconhecer o amor pela primeira vez. Foi um homossexual reprimido e, apesar daboa relação com o irmão, nem este parece considera-lo um igual. Como inconformistaque é, Ned alia-se a uma médica igualmente inconformada (Julia Roberts) queestá desesperada por financiamento para pesquisas e que vê os seus pacientes amorrerem sistematicamente sem que o governo atribua a devida importância aoassunto.
Demencionar que apenas em 1986 o Presidente Reagan finalmente menciona a doença peranteo país, permitindo que saia do estigma das minorias sociais.
Ofilme demonstra, sobretudo, o esforço levado a cabo e a união da comunidade gay, que se vê vítima de ainda maisdiscriminação perante o desconhecido.
Ofilme tem uma realização e um argumento muito realistas, muito terra-a-terra.Nada de dramatismo exagerado, por vezes o conformismo com que se aceita oinevitável é mais tocante que uma cena de lágrimas e gritos. É uma obra degrande sensibilidade, que mostra o amor homossexual com mestria, de um modo quetoca o coração e que não ridiculariza as diferenças nem cai em estereótipos. Ofilme está tão bem conseguido que, não fossem as repetidas menções aos direitosdas minorias, ao facto de os gaysserem igualmente cidadãos americanos, não teria atribuído qualquer importância àorientação sexual do casal principal. Ruffalo e Bomer trabalhavam comeficiência nas suas personagens – a actuação do primeiro é assombrosa, e osegundo completa-o. A química entre os dois é de louvar.
Maso que fica no final do filme é o sabor a amargo na boca. A dúvida se uns sãomais cidadãos do que outros, se há, ainda agora, um modo correcto e um modoerrado de viver, se merecemos todos o mesmo tipo de respeito e protecção porparte do Estado. Se o Estado, basicamente, nos leva a todos a sério.
NedWeeks compara a situação que atravessam ao passado recente do seu povo; todo omundo suspeitava do que estava a suceder aos judeus e, ainda assim, ninguém feznada. Todos lavaram daí as mãos até que o assunto “Hitler” lhes tocou também.Acrescenta que um dos grandes responsáveis pelo final da II Guerra Mundial (GreenBeret) foi um homossexual que acabou por se suicidar mais tarde devido à suaorientação sexual.
Éum filme sobre aceitar-se a si próprio, aceitar os outros como iguais, lutarpelos nossos direitos e abraçar causas, ainda que pareçam não nos tocardirectamente. É também um trabalho sobre frustração e esforço caído no vazio,porque nem sempre as coisas recebem a importância que merecem nem na altura devida.
Atéao final de 1986 houve 24 559 mortes relatadas” devido ao HIV. Só aí RonaldReagan finalmente se pronunciou acerca dessa epidemia. Desde aquilo que sepensa ter sido o surgimento da doença, em 1981, morreram, até hoje e emestimativa, cerca de 36 milhões de pessoas com SIDA. Isto equivale a cerca deseis vezes o holocausto.
Alertatambém para que não devemos eludir-nos: o vírus não está extinto, a cura nãofoi encontrada, e lá porque há controlo e mesmo um certo abafo da circunstância,ninguém está livre de vê-lo bater-lhe à porta.

Comovi-mee chorei com o filme. Compadeci-me da causa. Aprendi dados que consideroimportantes para melhor compreender a sociedade actual e o mundo em geral. Étudo o que peço da sétima arte.

«It’s because you are too good to be true, because I’ve been waiting for a lover like you for my whole life and you haven’t showed up until now, and I am scared as shit that I might do something to fuck it up. Am I crazy?»

#12 La Grande Bellezza | A Grande Decadência

 Título oficial: La Grande Bellezza @ 2013
Realizador: Paolo Sorrentino
Actores principais: Toni Servillo, Carlo Verdone, Sabrina Ferilli
Classificação IMDb: 7,8
Minha classificação: 9,0
Prémiações: Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro


A Grande Beleza é um filmearrojado, desconcertante, que nos obriga a olhar para nós próprios e para anossa posição face à sociedade. É também uma análise dura a essa mesmasociedade, num tom ora indulgente ora acusatório. Sendo Gep Gambardella (ToniServillo) o espectador, somos simultaneamente a sua consciência e o seu juiz.Isto porque Gep tem visão, tem consciência, tem uma voz que vai narrando a suapercepção do que o rodeia ao longo do filme.
Se mesmo Flaubert falhou aoescrever um livro sobre o nada…” Sendo esta, sem dúvida, a frase maissignificativa do filme. Gep está rodeado de um nada absoluto – um nada deespírito e de beleza que o impede de criar um novo livro.
Gep, jornalista, escreveu umlivro “O Aparelho Humano” há quarenta anos, o que lhe valeu um lugar na sociedade entre umaclasse alta em decadência e uma nobreza falida. Desde então é um frequentadorde festas, um amante de álcool, um praticante de sexo casual. As pessoascirculam pela sua vida sem deixar marca, tudo numa superficialidade que, porvezes, roça a hostilidade. Ninguém está limpo e todos conhecem os podres unsdos outros. Pessoas que teriam tudo para ser felizes – dinheiro, estatuto -,mas a quem falta nobreza de alma e força de espírito. Ainda assim, os diálogossão ilustrativos da falência dos valores e, em geral, cativantes eespirituosos. Cada linha do guião é algo de maior, susceptível a interpretação.


Gep está perdido, tem estadoperdido há quarenta anos. Um assumido misantropo que pertence à classe que tanto o repugna. Não há nada de sagrado na sua vida excepto, talvez, ogrande amor que perdeu na juventude. Ele próprio tem noção da mediocridade dasua “obra”, da nulidade da sua pessoa como escritor e jornalista. Nunca se sabeporque Elisa o deixou; a vida é mesmo assim, um grande e incómodo ponto deinterrogação. Mas consta que o amou a vida inteira, e essa descoberta causaincredibilidade e lança-o numa reflexão pessoal. Caminha então, só enostálgico, pelas ruas da Cidade Eterna. Terá Elisa amado o homem que se deitaquando os outros se levantam? Ou terá amado a camada interior dele, a queencarcerou ao lançar-se numa vida de excessos na capital?


Roma surge fotogénica, melancólica,também ela as ruínas graciosas de um Império caído. No interior dos seuspalácios arruinados consomem-se drogas, engatam-se pessoas cujos sonhos foramdestruídos ou se projectam prenhes de frivolidade, dão-se festas, convive-se comanões, esquizofrénicos, adúlteros, viciados na noite, toxicodependentes, strippers,noviças, até surge uma “Santa” mais para o final da trama. Um apontamentocomovente, por entre tanta loucura, o momento de nos reencontrarmos com afirmeza das crenças e da vontade de se fazer a diferença e de se honrar a obraque é o mundo. É a peça-chave do filme; alguém que vive de convicções por entrepessoas que são nada e que se arrastam vazias, sobre os tacões, de divertimentoem divertimento.
Um filme de grande beleza quelida com o feio, com o absurdo. Uma voz que tem consciência do ar que respira eque, ainda assim, escolhe cirandar por esse meio, julgando-se, quem sabe,superior. Um homem que não tem nada; nem filhos, nem um grande amor, nem amigossinceros, nem inspiração para retomar o sucesso literário, nem tempo. Dando-seconta do que perdeu, do que lhe escorreu por entre os dedos, Gep continua asorrir, continua a ser quem sabe ser; dança e bebe no seu palazzo com vista para o Coliseu.
O absurdo da sociedade moderna,assim exposto, causa um certo incómodo. Um homem que vê, que sente – ele própriogarante ter escolhido o caminho da sensibilidade – e que nunca praticou a suaprópria escolha, é decerto um homem desencontrado do seu destino.