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Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

O bloqueio de escritor

Tenho alturas em que me sinto tão, mas tão inspirada, mas não consigo sentar-me a escrever. Outras em que tenho imensa vontade de tornar ao hábito de me sentar e despejar palavras na folha em branco, mas não tenho nada a dizer. É preciso que estas duas vontades coincidam para que me sente e escreva. Também por isto não me assumo como escritora. Sinto-me escritora em 5% do meu tempo desperta. Parece-me pouco... gera poucas obras de significância, mas aqui também acho que cada um tem um número máximo de temas que lhe falam ao peito, ou de projetos que pode executar com sentimento e assertividade.

É preciso que a história me persiga, me assombre, me desperte durante a noite e me arranque lágrimas enquanto executo as tarefas mais banais em casa. Neste momento, tenho vários romances começados, outros que me acompanham durante o dia, que me acenam à distância. Mas não tenho a mínima vontade de me sentar a escrever. Se pudesse despejá-los num gravador, ou trazê-los, por via da telepatia, para outro suporte...

Concordo que a escrita seja trabalho mas, por minha experiência, sentar-me e obrigar-me a escrever raramente traz grandes resultados. Para mim, a árvore tem de estar plena de frutos, carregada e vergada sob eles, e aí, haja o que houver, largo tudo para colhê-los. Antes que me escapem, antes que apodreçam, acampo sob a árvore e colho-os de braços abertos. São ocasiões de júbilo, porque sinto que não precisei de fazer nada para que me caíssem no colo. Chamo a isso inspiração: o momento em que a história se apodera de mim e de todas as minhas horas, e não posso deixá-la para ir tomar banho, para comer ou para dormir. Nessas alturas, consigo tecer 350 páginas em 3 meses. Quando não sinto esse chamamento da fruta madura, da ideia bem delineada, arrasto-me durante meses ou anos com romances que avançam por via do trabalho - lento, desinspirado - mas não da compulsão de contar uma história.

Tenho tentado escrever livros catalizados pela inspiração, tanto o Demência como O Funeral da Nossa Mãe foram impulsionados por momentos de clareza avassaladora: sabia exatamente de onde essas histórias vinham, e para onde iam, e quem estava no centro delas, e que sentimento devia atravessar toda a narrativa.

Será que, perante as últimas oportunidades, conseguirei escrever só para produzir um manuscrito?