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Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

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Em torno das minhas leituras!

#31 FERREIRA, Andreia - Soberba Escuridão

Sinopse: Quando o relógio pisca as doze horas intermitentes, Carla recebe no seu quarto uma visita indesejada.A partir daí, todo o seu mundo desmorona e a solidão e o medo encarregam-se de a arrastar para um estado deprimente que só um desconhecido parece compreender.Cega de paixão, nega as evidências de que o seu novo amor é mais do que um rosto angelical. Ele esconde segredos que a levarão para perigos que parecem emergir das profundezas do inferno.

Opinião: Tenho imensa coisa paradizer a respeito desta primeira obra da Andreia Ferreira. Antes de mais,permitam-me clarificar um ponto: eu e a autora partilhamos a mesma editora, masnão temos contrato algum de bajulação mútua. Que isso fique claro, até porqueela é uma mulher do norte sem papas-na-língua e eu também tenho costela doNorte. Enfrentámo-nos ao vivo e a cores na Feira do Livro de Lisboa, no passadodia 6 de Maio, e o compromisso foi de que lhe daria a minha opinião sincera.Ela estava com receio de que não fosse favorável – porque o sobrenatural não éo meu género, nem nunca li nada se não agora A Guerra dos Tronos – e eu estavaaterrorizada com a possibilidade de não gostar do livro e não saber comodizer-lho. “Er…, dou-lhe um três e depois digo que está muito bem escrito masnão gosto destas coisas”, era esse o meu plano b), se não tivesse gostado daobra. O que, como vêm pelas cinco estrelinhas a cintilar a vermelho, não foi ocaso.

Esta classificaçãoespelha a minha redenção face ao cepticismo e também a minha estupefacçãoquando fechei o livro, há minutos. É uma lição de humildade e de mente aberta.Quando, por volta de Junho do ano passado, tomei conhecimento da existênciadeste livro no catálogo de obras da Alfarroba pensei: que péssimo, a febre dosvampiros chegou a Portugal. E que sabia eu dos vampiros ou deste géneroliterário? Exactamente, nada. Fiz logo o quadro todo em mente: a autora deviaser uma adolescente que vivia na lua (e, se vive na lua agora sei que é no bomsentido!) e que era maluca pelo Crepúsculo e tinha copiado a história, maiscoisa menos coisa. Os preconceitos - pré-conceito - surgem em relação aos assuntos mais inesperados, e assim me apercebi de como estava a julgar erradamente alguém pelo seu gosto de leitura/escrita. Mas isso passou-se há um ano atrás, e entretanto a Andreia tem-me vindo a dobrar. Primeiro com a sua simpatia e prontidão, depois e definitivamente com a sua obra.

Qual foi o meu banho decair no real quando comecei a falar com a Andreia e descobri que é uma adulta responsável– jovial, divertida e tagarela – que, de facto, vive na lua e sorve daí a suainspiração e daí lhe advém o talento. Vou roubar as palavras da própria emrelação a mim: Quando há talento, há! E encontrei-o logo desde o princípio dolivro. Às primeiras palavras tornou-se óbvio que ela não tem necessidade de seesforçar – é-lhe inato, vêm-se trechos que só podem advir de uma espontaneidadefluída que é o que consolida os bons escritores, os escritores de gema. A primeiraparte do livro (aí até à página cem) é, de facto, um pouco difícil dedesbastar. Isto porque a narração é fluída, com laivos de bom humor, e espelhamuito bem – melhor do que bem, através de expressões idiomáticas – a essênciado povo português. Da família portuguesa – sobretudo da mãe portuguesa, quequase “aterroriza” esta adolescente, a Carla, como as nossas mães e avós nosaterrorizam a nós com a hora do deitar e a pressa do levantar e os “ó filhaisto” e “ó filha aquilo”. Foi muito português de Portugal, e adorei essa faceta da história. Li, nalguns comentários, que as referências daAndreia lhe eram demasiado familiares. Bom, para mim foi tudo um terreno novo.Exceptuando o Harry Potter, os meus livros favoritos retratam realidadesinvulgares e enriquecedoras – mas realidades. Ia convencida de que ia ler um “montede clichés” sobre vampiros, mas levei outra bofetada quando me dei conta de queo livro aborda toda esta temática de um modo muito mais original. Embora sesaiba que o livro é do género sobrenatural, houve ali algumas explicações, emcertas alturas, sobre a existência e realidades paralelas, que fizeram umsentido estrondoso. Não digo que rocem uma possibilidade real, mas sãoextensões complexas demasiado amplas, raciocínios bem estruturados. Não sei setoda aquela arrumação das criaturas e dos seus mundos/realidades, misticismos eetc., encontra par em outras obras do género, mas se for esse o caso foram bemaplicadas. Se não for, muitos parabéns, Andreia, por teres inventado um mundocom contornos palpáveis.
Apesar de já conhecer aautora, consegui desligar-me dela ao ler o livro, o que espelha o quão bom eleé, o quão bem ele flui nas minhas mãos. Quando conheço o autor e leio a suaobra é como se bebesse as palavras dos seus lábios, como se o visse sentado acriar a história. Mas a Andreia não – não estava em lado nenhum. A Carla é aCarla e o livro é o livro, e ela é somente a criadora. Conseguiu criar algo deque gosta tanto completamente desprendido de si. As palavras são acessíveis, hámomentos que me puseram de nervos em franja, outros que me enterneceram (oromance está super bem explorado embora a Carla o viva com alguma imaturidade,gostaria de tê-la visto resistir ao jeitosão com mais afinco, de início, talvezser um pouco mais desconfiada), e houve momentos em que me segurei para não mepôr às gargalhadas. A Ana é, sem dúvida, a minha favorita. Gostei muito dapanóplia geral de personagens e, sobretudo, da coesão que lhes deste.
Como digo, um livro éum exercício de arquitectura e a Andreia soltou pontas ali e uniu-as aqui e aindadeixou margem para muito andamento no “Soberba Tentação”, que sai para Julho.Vou ter que penar muito até ler o segundo e, mais ainda, até ler o terceiro!
Para terminar gostavade dizer algo que acho que também já li algures em relação a esta autora e àsua obra, e que não pensei vir a concordar mas que de facto concordo comsinceridade: se fosse no estrangeiro teria inúmeras portas abertas e seria umsucesso enorme instantâneo. Criar-se-iam clubes de fãs com números enormes e,quem sabe, far-se-iam filmes e franchisings. Além de um bom enredo tens boaspalavras, bem escolhidas, e às vezes isso é o mais difícil. Dar substância auma história sem se ser pretensioso, nem aborrecido, nem maçador.
Cá fico, entristecida,com dois meses pela frente à espera da continuação…!
Classificação: 5*****

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