#257 DINIS, Júlio, Uma Família Inglesa
Opinião: Que achado delicioso!
Nunca me tinha inclinado para Júlio Dinis (Joaquim Guilherme Gomes Coelho - 1839-1871) nem para as suas obras mais sonantes (A Morgadinha dos Canaviais ou As Pupilas do Senhor Reitor, entre outros). Comprei o livro numa loja em de artigos em segunda mão, custou-me um euro e achei graça à edição, no acordo ortográfico em vigor nos anos 70.
O autor é conterrâneo de Eça de Queiróz e de Camilo Castelo Branco, e creio que faz uma ponte entre os estilos praticados por um e outro. Camilo vivia o amor lado a lado com a tragédia, não há finais felizes para os seus mais famosos amantes. Eça via o mundo com um realismo irónico (uma espécie de rir para não chorar), e expunha os defeitos da sociedade hipócrita do século XIX. O jovem Júlio, sendo médico e de ascendência inglesa, era versado em literatura saxónica, menciona grandes nomes como Byron e Sterne, ou ainda Walter Scott, e estava familiarizado com o modo de ser inglês e português (portuense, em específico). Teceu assim uma obra de 424 páginas que expõe os preconceitos entre classes (e nações), na sociedade moderna, progressista mas ainda assim com um quê de tacanhez do Porto nos anos 60 do século XIX.
As personagens centrais são a família Whitestone, a família Quintino, mas também as más linguas da cidade, que acabam por pesar no enredo e transtornar os seus protagonistas. Há muita perspicácia na narrativa do autor, que recria de modo realista as atrações da Invicta, o quotidiano desta e doutras personagens da cidade, e que parece encontrar regeneração na natureza, pois que os passeios pelos arrabaldes da cidade, dominados pela paisagem ao redor, transportam a personagem central para o mundo interior das reflexões e da auto-descoberta, enquanto a vida boémia da cidade - o teatro, o jogo, os charutos, as mulheres de má fama, os clubes, casas de pasto, etc. - propiciam convivências superficiais e por vezes até prejudiciais à tomada de um rumo na vida.
O autor foi minucioso no retrato da sociedade portuense com toda a sua vivacidade, bem como da mentalidade que assistia os vários extratos sociais que a compunham. Gostei tanto que creio que, muito em breve, vou voltar a lê-lo. Que orgulho por encontrar um autor que sublima assim a nação portuguesa! Que retrato fascinante do Porto e da sua gente...
E o amor? Pueril, mas intenso. Que aconchego de alma, este livro...
Sinopse: Em plena segunda metade do séc. XIX, Júlio Dinis apresenta-nos uma família que habita a ribeirinha cidade do Porto, os Whitestone. Mr. Richard é o chefe de família, um homem que simboliza fielmente a austeridade britânica. Homem de hábitos e já viúvo, é dono de uma casa comercial na Rua dos Ingleses, centro nevrálgico do comércio na cidade. Carlos é o filho mais velho.
Um jovem boémio, frequentador assíduo de cafés e de teatros, está completamente desligado dos negócios da família. Jenny é a filha mais nova. Desde a morte da mãe que ocupa o seu lugar no que toca a tudo que está relacionado com o universo doméstico. É ainda uma grande confidente do irmão e uma mediadora entre este e o pai de ambos. Todo o enredo se precipita quando, num baile de Carnaval, Carlos conhece uma misteriosa mascarada que, mais tarde, se vem a revelar ser Cecília, a filha de Manuel Quintino, guarda-livros na casa comercial dos Whitestone.