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Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

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#269 LAWRENCE, D.H., O Amante de Lady Chatterley

350x (1).jpgOpinião: Por volta da página 150, isto é, mais ou menos a metade do livro, estava tão aborrecida que ponderei abandoná-lo. Por sorte, lembrei-me de acorrer aos "Sábados de Plantão" da página de instagram Literacidades, e colocar o meu problema. "Estou cansada do livro, devo abandoná-lo?". O conselho foi no sentido de estabelecer um limite de páginas diário e ir avançando a partir daí. Cumpri no primeiro dia, a custo. Cumpri no segundo, um pouco menos a custo. No terceiro a noção de obrigação desfez-se e li as 128 páginas restantes. Cheguei ao fim, e ainda bem!

"Nunca conheci nenhum homem que fosse capaz de estabelecer uma verdadeira intimidade com uma mulher, de se entregar a ela. Isso sempre foi o que eu quis. Eu não estou disposta a ser o brinquedo de um homem, e muito menos o seu objeto de prazer."

Esta obra do britânico D. H. Lawrence constituiu um escândalo quando chegou às bancas, e não é de admirar tendo em conta que se trata de uma publicação entre-guerras, que terá com certeza chocado a sociedade inglesa e europeia em 1928. A narrativa está impregnada desse desencanto que se seguiu à Primeira Guerra Mundial, altura em que toda uma nação foi chamada a unir esforços por uma causa. Depois do verdadeiro valor de cada um ser testado na guerra, os homens regressam a casa, para os braços das mulheres que agora se sabem capazes de viver sem eles, de poder trabalhar e de conseguirem sustentar-se, e à mediocridade da sua classe. Este livro é muito sobre estratos sociais, sobre a rigidez da hierarquia numa Inglaterra que luta por se manter aristocrática, mas que é cada vez mais burguesa e operária. Fala-se em socialismo, em anarquia, fala-se em operários e em industriais, e à sombra de tudo isso as classes altas tornam-se obsoletas, ridicularizadas, bastiões de tempos idos. Trata-se também de um romance de pessoas desencantadas, profundamente desiludidas com o mundo que habitam, as pessoas que o povoam e o futuro que se adivinha.

Constance Chatterley é uma jovem inglesa relativamente empenhada no seu casamento com um aristocrata paraplégico (e impotente), e a sua vida decorre sem grandes aspirações nem sobressaltos, à excepção da inquietação por não poder ser mãe. Está disposta a aceitar o seu destino e a manter as suas promessas, inclusive a de nunca deixar o marido. Compromete-se assim a viver uma vida conformada e cinzenta, como a vila mineira a algumas milhas, rodeada de natureza luxuriante enquanto ela própria se sente estéril e rarefeita. 

A dada altura, conhece Mellors, o intratável guarda de caça da propriedade, e o mundo desengraçado que se habituou a aceitar - e que a faz definhar - cobre-se de um novo alento. A sua relação com o guarda - tensa, sensual, proibida - torna-se-lhe essencial para que se considere viva, para que experiencie, para que os seus dias valham a pena e, acima de tudo, para cumprir o seu sonho de ser mãe. 

Trata-se de uma obra que, julgo entendê-lo agora, expõe o aborrecimento - o vazio - da vida de Connie, e consequentemente da aristocracia e de toda a humanidade no pós-primeira guerra, ao ponto de levar o leitor à exasperação. Se essa primeira metade do romance não fosse tão sensaborona, a segunda ter-me ia sabido a aventura, a paixão? É como se o pulso de Constance só começasse a bater a meio da narrativa quando, involuntariamente, acaba por se entregar, também em espírito, a Mellors.

Apesar de ter sido publicado em 1928, O Amante de Lady Chatterley permanece moderno no modo como aborda o papel e as relações de homens e mulheres em sociedade, e também a sua interação uns com os outros. O espírito de confissão entre as mulheres contrasta com a hostilidade de classes entre os homens, como se as primeiras procurassem compreensão enquanto os segundos procuram valor, sobrepor-se uns aos outros. Também na sua descrição das relações íntimas - o verdadeiro motivo pelo qual peguei no livro -, é terno e cru, de tal modo que não julgo ter jamais encontrado a intimidade de um casal assim exposta em literatura, e de maneira tão fiel àquilo que reconheço como amor carnal, e que conduz à inevitável união espiritual de duas pessoas alienadas do seu presente e descrentes no futuro. Parece-me que, nesta narrativa, o autor toca no núcleo delicado onde nasce, verdadeiramente, o amor; indissociado da carne e da nossa condição de animais pensantes.

Sinopse: "A história da relação entre Constance Chatterley e Mellors, o guarda de caça do seu marido inválido, é o romance mais controverso de Lawrence e talvez o seu texto mais comovente sobre o amor."

Classificação: 4****/*