Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

#179 LONDON, Julia, A Vingança de Lorde Eberlin


Sinopse: Inglaterra, 1808 - De novo em Hadley Green após quinze anos, o jovem Tobin Scott, agora Lorde Eberlin, tem apenas um objetivo em mente: vingar a morte do pai, acusado injustamente de roubar as joias fabulosas dos Ashwood. Mas quando se vê do outro lado da rua em relação ao objeto do seu ressentimento, o plano pacientemente preparado toma um rumo surpreendente. Lily Boudine, condessa de Ashwood, já não é a menina que ele recordava, é uma bela mulher que está a fazer o possível por restituir à propriedade da família o seu antigo esplendor. Convencida da inocência de Joseph Scott, ela propõe a Tobin unirem forças para encontrar as famigeradas joias e restaurar a honra do seu pai. Em breve, porém, a paixão entre os dois incendeia-se, e um novo segredo chocante vem lentamente ao de cima...
Em 1793, um homem pagou com a vida por um crime que provavelmente não cometeu. Anos mais tarde, o mistério de Hadley Green continua sem solução. 

Opinião: Este livro deu-me sentimentos controversos. Estava desesperada por descobrir se ainda consigo começar e acabar um livro, pelo que o comprei por impulso no aeroporto. O início foi lento e não sabia o que esperar. Já li tantos livros do género... Mas foi ficando melhor. As personagens ficaram mais profundas e mantiveram o factor humano. Se leram a sinopse entenderam: a Lily testemunhou que viu o pai do Tobin a sair da mansão na noite em que umas jóias preciosas desapareceram. Tinha oito anos na altura e os juízes concluíram que o pai dele fora o autor do roubo. É condenado a morte e o Tobin e a família são destituídos. É mais original do que a maioria dos enredos do género. Há um óbvio dilema moral, mas a autora desenvolveu-o com graciosidade. As personagens não são unidimensionais, vão assimilando novos sentimentos enquanto lutam por lidar com os anteriores. Alguns momentos foram muito ternos. Percebe-se porque é que aquelas duas pessoas imperfeitas e feridas se apaixonam um pelo outro. Também há algum humor no livro, e alguma consideração pela época. Não é que toda a gente vá aceitar o Tobin só porque é bonito e rico. Comprou um título na Dinamarca, o que na maioria dos livros seria suficiente para atirar as solteiras para os pés da personagem principal masculina. Mas neste livro a Julia London respeitou as convenções. Ele é ainda mais desprezado por ter comprado o título. Não é bem recebido sequer pelas personagens simpáticas dos outros livros da série, apenas porque não é assim que as coisas funcionavam.
Há muitas dificuldades a ultrapassar neste livro, pelo que estive sempre na expectativa, sem saber que caminho a autora ia tomar. Felizmente, não escolheu o mais fácil - não houve perdões falsos nem alguém a dizer "se gostas dele esquece a tua posição, o que é a posição social comparada com o amor?", etc. Gostei disso. Para mais, o Tobin não é uma figura toda-poderosa. Não consegue subjugar as suas origens, o que o deixa frustrado porque também é orgulhoso. Além disso, ele tem (view spoiler), o que lhe acrescenta outro factor humano. Portanto ele tem falhas e é de carne e osso. Adorei a Lucy - uma menina que diz tudo o que lhe apraz - e McKenzie, o amigo escocês um tanto inconvencional do Tobin.
Houve algumas falhas, no entanto. Não sei se o problema é da tradução portuguesa - pejada de erros, a propósito (gralhas e verbos misturados, além de que ora se dirigem um ao outro por "tu" ora por "você" - mas estavam sempre a mencionar uma "lama negra" dentro do Tobin, e que estar perto da Lily abria frestas de luz nessa lama. Tudo bem se mencionado uma ou outra vez, mas sempre que estão juntos, a mesma metáfora? Foi parvo e aborrecido, a dada altura. Além disso, não havia grande negrume no carácter dele. Estava magoado e furioso com a injustiça no seu passado, mas conforme os factos lhe são apresentados, tem a mente aberta e vai aceitando. Também nunca é descrito como cruel ou maldoso. Simplesmente quer que alguém pague pelas consequências dos seus actos - e "alguém" é a Lily. Outra coisa é o facto de saltarem muito rápido do desprezo mútuo para o envolvimento físico, como se na época fosse assim tão fácil andar-se aos beijos. Teria apreciado alguma consideração pela época aqui também.
Em geral foi uma leitura agradável. Mal posso esperar por voltar para Portugal e comprar o primeiro livro da série. O terceiro já foi publicado? Vou ler de certeza!


Classificação: 3,75***/**

#178 CACHAPA, Possidónio, Viagem ao Coração dos Pássaros

Sinopse: Viagem ao Coração dos Pássaros remete-nos para um universo único mas que derepete sempre no tempo dos seres humanos. Fala-nos das contradições e dialéticado mundo, do amor, da vida, mas também dos seus opostos. É um livro que se lênum sopro, como se fosse um instante, numa viagem que o leitor faz ao coração,o seu próprio, e o dos  protagonistas da história, realista, autêntica ebela. Possidónio Cachapa conduz-nos através da sua escritaprofunda, revelando-nos os dons que todos temos e as nossas virtudes mas tambémas nossas debilidades e fraquezas, numa simplicidade narrativa que nos prendeda primeira à última página.

Opinião: 

“— Kika – pediu ele, em lágrimas. – Gostas de mim?
Kika virou-se na cama e respondeu:
– Não.
E, dizendo isto, rodou no leito, onde uma mancha de pena se espalhara e lhe humedecera a face humana. O Escritor voltou a chorar, roído de piedade de si próprio e perguntando a ele mesmo o nome da fraqueza que o diminuía diante da mulher.
Ela, se não fosse ela, ter-lhe-ia passado a mão na face e dito que ele era tão perfeito quanto um homem pode ser. E se isso não lhe bastava, era porque a sua natureza era ruim e ambiciosa. Que todos a tomavam por boa por equívoco. E que amá-la era o mesmo que meter uma jibóia na cama; que nem com a barriga cheia de ratos a impediria de cumprir a sua natureza.”

Não fazia ideia do que esperar desta minha primeira abordagem a Possidónio Cachapa. Decerto não a dimensão que encontrei, nem as incertezas para onde a mesma me atirou. A história resume-se de modo simples: Evangelina casa-se com Filipe numa ilha que creio ser a Madeira, devido à menção às levadas. Têm uma menina que nasce prematuramente, chamada Maria Joaquina (Kika) e Filipe não consegue ficar, apesar de as amar, e sai de cena. Tudo o resto é preenchido por uma extensão da dimensão do espaço e do tempo, em que cada um é o que é, o que foi e o que há-de ser, e que esta é só uma vida de várias, sendo que se toma diversas formas a cada uma. E os mortos andam lado a lado com os vivos, e alguns vivos já transportam um pouco da morte consigo, porque os mal estares vêm da alma e acabam por levar ao enterro dos corpos. É então evidente que não há, realmente, nada de simples neste livro. Gosto quando os autores me atiram para este limbo, em que não sei onde acaba o criador e onde começa o narrador (isto é: alter-ego emprestado ao livro). Mais inquietante ainda: não sei onde acabam as crenças de quem o escreveu e onde começa o propósito com que o escreveu. Viagem ao Coração dos Pássarosé, assim, despretensioso. No entanto demonstra grandeza a cada virar de página. A condição da vida na Terra (mais do que a “humana”) é explorada de modo inventivo e desconcertante. Lê-se sobre um pássaro como se lê sobre gente. Lê-se sobre a carne como se fosse a mera morada do espírito no mundo sólido, e que por isso limita e por vezes até corrompe o dito espírito - é tudo parte de um plano maior. A existência singela por toda a parte, mas as luzes que se voltam para uma menina com um dom; e que fala por dentro da cabeça das pessoas, porque fez a promessa de se manter de boca fechada até o pai voltar. Uma menina que começa por contrariar o seu próprio destino, porque o universo dispõe de nós como lhe apraz, e apesar de não podermos fugir ao que nos foi traçado, por vezes perdemos alguma energia a tentar...
Vale a pena, lê-se bem. Não é fácil, contudo. Tira-nos de onde estamos e traz mais dúvidas do que respostas. Felizmente para mim – seja, ou não, um reflexo das crenças do autor -, acompanhei algumas coisas por serem familiares àquilo que também eu acredito. Coisas como sermos todos parte de um mesmo plano. Ou como termos várias passagens pela terra, umas como homens, outras como flores, outras ainda como pássaros. Vou estar atenta às suas obras, de modo a separar os universos “autor” e “livro”. Parecem-me ambos bastante interessantes. 

Classificação: 4****/*