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Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

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Em torno das minhas leituras!

#97 CLAUDEL, Philippe, O Barulho das Chaves

Philippe Claudel é perturbador.Entranha-se-me nos ossos. Em tantos anos de leitura, consegue uma coisa que meé já rara: intrigar-me. Este homem intriga-me. Além de me intrigar, deixa-mepresa a ele. Ainda só li duas das suas obras – O Barulho das Chaves e Almas Cinzentas. O Barulho das Chaves contém pequenos relatos, muito fáceis de ler,compilados em 76 páginas. Refere-se aos onze anos que passou a ensinar Francêsnum estabelecimento prisional. Este livro, tão cinzento quanto a sua outra obraque li, ajuda a compreendê-lo para lá do explicável. Claro que Claudel escreveuo Almas Cinzentas. Quem se não um homem que lidou com esta dicotomia de coresna natureza humana poderia escrever um livro sobre sermos todos cinzentos, enão exactamente brancos ou pretos?
Claudel é ousado. Claudel tira-meo sono. Açambarca-me os pensamentos, conquista-me e transforma-me. A cada livroseu uma nova inquietação. A natureza humana perante a minha vista, tão claracontada pela sua voz, tão genuína nas suas percepções – e não julgamentos -, eeu cega para ela até aqui.
«Marcel B., cinquenta e seteanos, prestes a ser libertado por falta de provas suficientes, depois de tersido acusado de abusar sexualmente da neta de onze anos, e que preferiuenforcar-se no fecho da janela da cela, durante a noite anterior à sualibertação, em vez de regressar à aldeia.».
E prossegue, recordando-sealgures doutro recluso:
«William I. era mecânico “na vidacivil”, como ele dizia. Confessou-me que, todas as noites, montava e desmontavamentalmente, peça a peça, o motor de um 504diesel. “Para aguentar”, acrescentava.»
E eu não prossigo. Não posso prosseguir.Deixo-me ficar, meio entorpecida, pela consciência desta humanidade cinzenta,ambígua, tão simultaneamente abjecta e vulnerável, enternecedora, sobre a qualClaudel me vai falando.

Por agora tenho de guardar ORelatório de Broderick para mais tarde. Não quero arriscar-me a esgotar todosos meus recursos do Claudel enquanto não há muito mais. Vou saboreá-lo aospoucos, como a minha mãe dizia que fazia com o chocolate quando era pequena. Nãopode haver impulsos de devoração compulsiva quando sabemos que depois disso só recriminação. 

#96 LAVADO, L.C., Inverno de Sombras


Opinião: Way to go, Liliana! É tudo o que me ocorre quando acabei, há cinco minutos, o mind blowing que foi terminar o “Inverno de Sombras”. Foi-me outra chapada sem mão. O que li eu de fantasia na minha vida? Dois livros do Tolkien – que apreciei bastante, sim – e o Harry Potter. Ah, o Frankenstein pode ser considerado fantasia? Li os livros da Andreia Ferreira, que me introduziram neste mundo, and that’s it. E aqui a Célia, que faz um esforço sobrehumano para mergulhar nisso das vampiragens, fantasmas, lobisomens, feiticeiros e bruxas – e que foge a sete pés da Alice no País das Maravilhas – está boquiaberta com a maravilha que acabou de ler. Mais outra peça-chave no mundo trémulo da ficção fantástica onde continuo a dar passinhos de bebé.

Imaginação para mundos que não existem? Não tenho nenhuma. Costumo ter até uma certa dificuldade em abstrair-me. Mas verdade seja dita que poucos livros tiveram de mim o entusiasmo que o Harry Potter conseguia sem esforço. Ler – acreditar – (n)um livro de fantasia nesta fase da minha vida abriu-me portas e inúmeros caminhos por explorar.

Antes de mais, cumprimento a autora pela imaginação brilhante e pela capacidade de lógica e raciocínio que foram essenciais à edificação deste romance. Fácil? Garanto que não foi, embora ela tenha uma clara desenvoltura nesta área. Depois as personagens; mesmo que pertencessem ao mais aborrecido dos cenários, são multidimensionais, bem caracterizadas, com linguagens, gestos e atitudes próprias. Cativantes, todas elas.

Para quem está curioso, informo que esta sinopse é das poucas que não mentem: há mesmo mistério, acção, romance. Ninguém está totalmente desprovido de culpas, ninguém é cem por cento mau, todos têm segundas intenções, ninguém é o que parece. Preparem-se para muitos twists, muito peito apertado, muito suspense, muita angústia. Senti tudo isto – polvilhado com risos difíceis de disfarçar – conforme lia. A autora arrancou-me todas essas emoções, imergiu-me desse modo tão eficaz numa trama tão impensada.
Para quem vai ler agora, respondo às dúvidas que tive na primeira centena de páginas, quando via que só se falava dos segredos da Andrea, do Danton, da Anne. Quem seria esta gente? Porque não falariam eles no doce Pierre? Acreditem; o Danton será tudo o que vos interessa e reúne todos os ingredientes que considero essenciais a uma boa personagem (sobretudo masculina). Aquela perturbação, aqueles impasses, o redimo-me ou não? O – há alguma coisa de que me redimir? – conquistaram-me de todo.
Obrigada Liliana, estou chocada com a quantidade de talento e capacidade numa escrita que, em retrospectiva, é ainda bem jovem e tem muuuuuuitos anos de literatura para nos oferecer.
Next: Fantasmas de Pedra?

Sinopse: “Todos ficam sujos de sangue e há sempre alguém que morre.”  Este é o lema de Danton. Filho de dois poderosos feiticeiros, inimigos de séculos, a existência de Danton é apenas mais um golpe de guerra entre os pais. Criado e aperfeiçoado por Amauri e Goulart, é temido por todos, incluindo os próprios. Em Lisboa, uma misteriosa Caixa detém um poder que a família Santa-Bárbara guarda há gerações. Isadora é a última descendente de uma linhagem de Paladinos, herdeira solitária de um império cultural e um legado que desconhece. Ela e o tio, Garrett, são tudo o que resta para proteger este grande segredo. Mas Danton está decidido que é chegada a hora do poder da Caixa lhe pertencer, e as vidas dos Santa-Bárbara vão alterar-se para sempre. Feitiçaria, magia, segredos e uma história de amor inesquecível, percorrem alguns dos lugares mais conhecidos de Lisboa e a zona mais sinistra de Paris. O passado colide com o presente e tudo acontece… mas não como todos esperam.