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Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

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#95 CORTÁZAR, Julio, O Jogo do Mundo


Opinião: Eu quis muito apaixonar-me por este livro. Vivê-lo, digamos assim. La Rayuela, capítulo 7. Na voz de Julio Cortázar, senti a boca cheia de flores ou peixes enquanto beijava um grande amor. É o meu pedaço favorito de literatura de sempre. Por muito que o livro não seja o meu favorito, essa preciosidade é. É um livro intimista, todo ele poderia passar-se dentro da cabeça (conturbada) do Oliveira, que deambula nas ruas de Paris. São pessoas complicadas, o Oliveira, a Maga e o Clube da Serpente, que discutem questões literárias. Abrem uns quantos debates nesta área e apresentam-nos Blues de excelente qualidade. É um retrato intimista de uma pobreza que o não é de mente. Nus de personagens poderosas, multidimensionais, que tocam e mudam e aconchegam a vida uns dos outros. Um estilo narrativo difícil, volátil, com rasgos de genialidade. Amei de paixão cerca de 75% do livro, mas a retirada de uma das minhas personagens favoritas da acção originou uma cisão na leitura. Voltei a pegar-lhe hoje, sem saber que o terminaria de enfiada. Pareceram-me quase aborrecidos e entediantes estes últimos capítulos. Mencionei a existência de uma chave para ler o livro? Cap. 2, cap. 141, ca. 3, cap. 110, cap. 4., etc. Li-o como sugerido pelo autor, sem saber em que pé da narração me encontrava. Não há um princípio-meio-fim. O capítulo 56, o último da estrutura “convencional”, foi um esvoaçar de páginas, passei-o na diagonal, um pouco entediada. É difícil mantermo-nos à tona num livro como este, que por vezes roça a genialidade absurda. Mais tarde, com outra maturidade, tentarei buscá-lo de novo e, quem sabe, todo ele me saiba a mel.
Por agora, não foi o momento certo. Cortázar merece-me a 100%, e eu andei a meio gás.

Julio Cortázar é um grande nome da literatura Argentina. Publicou "La Rayuela", ou o Jogo do Mundo em 1963 e o livro continua a encantar jovens mundo fora. Segundo as palavras do próprio, esta obra foi incompreendida pelo público a que pensou que pudesse dirigir-se. Foram os jovens, esses sim, a captar-lhe a essência e a deixarem-se fascinar pelo seu conteúdo. Também admitiu que dificilmente consegue escrever sobre o indivíduo a sós em si próprio. Escrevia sim sobre grupos, círculos, e sobre as suas interacções. O papel do todo perante cada um e o que o "eu" é face ao todo.

Os Gotan Project, que misturam a sofisticação francesa com o tango argentino, têm uma homenagem musical ao capítulo 7 desta obra.

Sinopse: O amor turbulento de Oliveira e da «Maga», os amigos do Clube da Serpente, as caminhadas por Paris em busca do Céu e do Inferno, têm o seu outro lado na aventura simétrica de Oliveira, Talita e Traveler, numa Buenos Aires refém da memória.


A publicação de «O jogo do mundo» (Rayuela) em 1963 foi uma verdadeira revolução no romance mundial: pela primeira vez, um escritor levava até às últimas consequências a vontade de transgredir a ordem tradicional de uma história e a linguagem usada para a contar. O resultado é este livro único, cheio de humor, de risco e de uma originalidade sem precedentes.
Considerado o romance que melhor retrata as inquietudes e melhor resume o Século XX na visão latino-americana do mundo, desde a sua publicação, gerações de escritores são, de uma maneira ou de outra, devedoras de «O jogo do mundo».

Classificação: 4****/*


#94 ALCOFORADO, Mariana, Cartas Portuguesas


Na realidade já as tinha lido anteriormente, mas não sei se tinha lido todas e com o espírito com que as li agora. Estava em Beja, com as minhas duas irmãs, e senti necessidade de as ligar àquela cidade tanto quanto lhe sou ligada. Aproveitei as tecnologias para baixá-las da internet e ler-lhas, visto que no dia seguinte iríamos ao Convento da Conceição ver a janela que, afinal, não está no local original. Apenas os ferros são os mesmos.

Os franceses reinvindicam a autoria destas cartas, originalmente publicadas em 1669 em França e, posteriormente, na Alemanha. Não acredito que a profundidade deste retrato psicológico feminino pertença a um qualquer "escritor". Creio realmente que estes queixumes partem da mão da pessoa que sofreu, na pele, as agruras dum amor enganado, não correspondido.
Nas duas primeiras cartas, Mariana transparece o sopro nefasto da esperança, do desengano. Está apaixonada e crê que o Marquês de Chamilly sente igualmente a sua falta. Com o avançar das cartas, um ano depois, menciona o engano de que foi vítima. Lamenta ter-se-lhe entregado (é assim que entendo as alusões a prazeres e entrega), praticamente o acusa de ter sido oportunista e de a ter escolhido para desgraçar. O tom lamurioso torna-se aborrecido, como uma amiga que sofre por amor e nos enche os ouvidos. Já fui essa pessoa. A dada altura só nos apetece dizer: esquece-o, anda para a frente, já viste que ele não volta, que não vale a pena. Contudo a sua angústia é justificada e dói na alma.
Mariana referencia a D. Brites, madre do convento, a janela de Mértola, a cidade de Beja, os cavaleiros franceses. Isto sem o pretensiosismo dum escrito e com a veracidade de uma situação real.

Mariana nasceu em 1640, ingressou no Convento da Conceição aos 11 anos e lá morreu, em 1723. Não faço ideia se terá sido algum dia confrontada com algum leitor curioso a respeito das suas supostas cartas de amor.

Li também, há muitos anos, o Mariana da Katherine Vaz, que me deu a conhecer este episódio delicioso da nossa história.