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Castelos de Letras

Em torno das minhas leituras!

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#158 FACIOLINCE, Héctor Abad, Oculta


Sinopse: «Emergi muito devagar àsuperfície do lago, tentando não fazer barulho. A minha boca aberta começou aengolir ar uma e outra vez, a toda a velocidade. Duas, três, cinco, sete vezes.O coração ribombava-me no peito como o bombo mais imponente de uma banda dealdeia. Ouvi vozes e insultos provenientes da casa. Vários feixes de luzperscrutavam o lago. Voltei a mergulhar. […] Não via nada debaixo de água, nemque abrisse os olhos: era uma barreira viscosa, negra, fria, que com a pressade fugir parecia uma sopa de óleo que me untava os braços e as pernas e meobrigava a avançar devagar, por mais que os agitasse com todas as minhasforças.»
Assim começa um dos episódios maisdramáticos deste romance que gira em torno de La Oculta, uma propriedadeescondida nas montanhas da Colômbia. Pilar, Eva e Antonio são os últimosherdeiros desta terra, que passou por várias gerações da família. Aí viveram osmomentos mais felizes das suas vidas, mas também tiveram de enfrentar aviolência e o terror, o desassossego e a fuga. A partir das vozes dos trêsirmãos, do relato que fazem dos seus amores, medos, desejos e esperanças, comuma paisagem deslumbrante como pano de fundo, Héctor Abad Faciolince mostra asvicissitudes de uma família e de uma povoação, assim como o momento em que oparaíso está a ponto de se perder. 

Opinião: “Gosta-sede uma quinta como se gosta de um marido, de uma mulher, de um velho amor a quededicámos muito tempo e quase todas as nossas energias. Aprendemos a gostardela quando éramos crianças, por via de uma felicidade genuína, espontânea, àprimeira vista, no sol da infância e nos dias azuis.” 
“Oculta” (Quetzal, 2016) é o mais recente romance de Hector Abad Faciolince. Aperspectiva deste colunista que vive em Bogotá é a de uma Colômbia desde o seubaptismo como Nueva Granada, colonizada de negros, espanhóis, missionários,judeus, mercenários e cafezeiros, até se tornar num país que começa a abrir-seao progresso.
Ainda que a espinha doromance seja a história da família Ángel, o apeadeiro é La Oculta, apropriedade que a família detém há séculos. O livro delineia-se a partir doparalelo casa/passado. Três irmãos – Eva, Pilar e António (Toño) exprimem osseus pareceres a três vozes muito distintas.
Toño é apaixonado pelopassado, pelo que está empenhado em reconstruir os passos da família desde asua chegada às encostas de Jericó. Homossexual, teve de deixar o meio fechadoda Antioquia (que qualifica de tosco, homófobo, racista) para poder viver sempreconceitos em Nova Iorque.
Eva narra, sobretudo, assuas aventuras amorosas e um episódio que macula as lembranças felizes de LaOculta: aquele em que paramilitares e a máfia local se juntam para tentarexpropriá-los da sua terra.
Pilar é a irmã um tantotacanha, que nunca saiu da Colômbia, porém plenamente resolvida no amor. Viveum casamento de várias décadas e valeu-se do seu pragmatismo e zelo para cuidarda família, personificando assim a tradição e o imaginário do povo colombiano.
O ritmo do romance é bemcompassado, porém são as personagens que ficam um pouco aquém, por até meio doromance parecerem decalques já encontrados um pouco por toda a literatura.Toño, efeminado desde pequeno por ter sido cuidado pela mãe e pelas duas irmãs,que abomina o trabalho braçal e cuida das mãos, e que não gosta de brincadeirasde rapazes e que é casado com um gay artista (e sensível).
Eva, mulher sem defeitos,linda, inteligente, várias vezes casada e outras tantas divorciada, amante dedesportos e um tanto leviana.
E Pilar, a “matrona” que dedicou a vida aos interesses da família.
Algumas asserções podem gerar controvérsia, como a de que “as mulheres nãoquerem saber do passado”, por serem práticas e viverem para as tarefas dodia-a-dia e para os desafios conforme estes se lhes apresentam, enquanto ohomem parece um passo à frente na racionalidade e busca nas entrelinhas do seupassado um sentido para o seu presente.
A História do país vemassim desvendada por intermédio da história destes judeus convertidos. Os jogospolíticos e o estabelecimento de hierarquias locais enriquecem em muito anarrativa, assim como a formação do poder local, sob a forma de máfias e deforça militar corrupta. Sem dúvida, um autor a acompanhar.
O despertar para a intimidade dos três irmãos surge de modo delicado eexplícito, o que consagra a destreza do autor para ilustrar episódios épicos eoutros do foro pessoal com a mesma intensidade. 
Um romance que prima peloretrato meticuloso da Colômbia nos últimos séculos, e que é quase um ensaioromanceado sobre a formação de um país.

Classificação: 3***/**