#142 HARDY, Thomas, Longe da Multidão
Sinopse: Longe da Multidão é um dos romances mais conhecidos de Thomas Hardy. Narra a história de Gabriel Oak e da sua grande paixão pela bela, independente e enigmática Bathsheba Everdene, que chegou a Weatherbury como herdeira de uma vasta propriedade rural. Mas a jovem é também pretendida pelo sedutor sargento Troy e pelo respeitável agricultor de meia-idade Boldwood. Ao mesmo tempo que os destinos destes três homens dependem da escolha de Bathsheba, ela descobre as terríveis consequências do seu coração inconstante. O jogo das personagens, com as sumptuosas paisagens rurais como pano de fundo, contribuiu para fazer deste romance notável um dos grandes clássicos da literatura inglesa.
Opinião: Thomas Hardy, romancista do século XIX, publica "Far From the Madding Crowd" em 1874. Pensando em literatura vitoriana, temos por exemplo, daquilo que li, O Monte dos Vendavais e Jane Eyre (tardo-gótico/naturalista). Em todos é explorada a psique da mulher, o peso de cenários fortes que influcenciam o desenrolar da acção e a fragilidade da mente humana, que tende a ceder sob pressão...
Considerado por alguns "o último dos vitorianos", Hardy, claramente céptico e pessimista, explora as oportunidades, as incertezas e o carácter volátil dos sentimentos. Isto de um modo que introduz já um racionalismo metódico exaustivo. Certo que ele reveu o livro duas vezes em vida exaustivamente - em 1894 e em 1901, se não estou em erro - e decerto introduziu algumas mudanças subtis.
Alguém dizia, no início da sua review a este livro, para esquecermos a ideia de um triângulo amoroso. Em “Longe da Multidão”, Thomas Hardy, este arquitecto que escolhe o mundo rural como cenário da sua obra-prima, apresenta-nos Barthsheba Everdene, Gabriel Oak, Francis Troy e William Boldwood. Não acredito que o acaso represente um papel neste romance, pois apesar da tragicidade de algumas passagens, predomina um racionalismo frio, cru, metódico. Tudo acontece sem dar grande espaço a sentimentalismos, e a narração, na terceira pessoa e alternando, por vezes no mesmo capítulo, da perspectiva de uma personagem para as outras, vem sempre revestida de uma tentativa de aligeirar as emoções sob o verniz da razão.
Barthsheba é uma personagem palpável, de tão humana. Observamos o modo como o autor desenvolve a sua personalidade, de uma jovem que respira liberdade, sem bens nem perspectivas, e depois esmagada pela responsabilidade da herança do tio, oprimida pela miríade de possibilidades que a sua nova condição lhe permite. A inovação aqui consiste em termos um autor masculino de uma erudição invejável – e por vezes constrangedora – a escolher um furacão feminino, com as suas convicções e fragilidades, para eixo central do seu romance. Gabriel Oak parece-me o coprotagonista, no sentido em que acaba por ter um parecer ou uma mão quase omnipresente em quase todos os momentos cruciais do enredo.
Apreciei o modo como a jovem Barthsheba apregoa aos quatro ventos que far-se-á respeitar como uma grande proprietária rural, sem ter de se transformar na sombra de um marido inconveniente. Mais tarde, por obrigação, quase se promete em casamento ao vizinho, Mr. Boldwood, depois segue o coração e recusa-se-lhe, apenas para ir recair numa armadilha do mesmo órgão um pouco mais adiante na estrada, ao deixar-se impressionar pela beleza e os modos do sargento Troy. Gabriel assiste a tudo isto, vivenciando-o na condição de primeiro seu pastor e depois seu maioral. É a figura que elimina todos os rumores a respeito da sua senhora, e que nela deposita uma fé apostólica.
Trata-se de uma narrativa prenhe de humanidade, de calculismo e de ingenuidade, num contraste harmonioso entre expectativa e realidade, bater de asas e consequência. Demorei quatro longos meses a lê-lo, por cada citação bíblica, mitológica ou literária que surgia a enriquecer o texto, pelas descrições extensivas e por vezes extenuantes, e pela complexidade das personagens e das suas circunstâncias.
Atribuo 4,5, os 0,5 que faltam para a perfeição devem-se ao facto de o livro não ter despertado em mim uma paixão fulminante. Entendi a Barthsheba e o Oak, bem como as outras duas personagens principais, mas faltou-me a chama que me traz lágrimas aos olhos sempre que me recordo de "E Tudo o Vento Levou" ou de um "O Monte dos Vendavais", tão grotesco quanto magnífico.
Não lhe falta, porém, elevada qualidade literária. Aconselho a quem aprecia histórias de amor e de terra atribuladas. E há sempre aquele sentimento de realização pessoal quando terminamos um livro desafiante... este foi bastante Hard (tinha a piada em mangas desde que li a segunda linha do dito cujo).
Considerado por alguns "o último dos vitorianos", Hardy, claramente céptico e pessimista, explora as oportunidades, as incertezas e o carácter volátil dos sentimentos. Isto de um modo que introduz já um racionalismo metódico exaustivo. Certo que ele reveu o livro duas vezes em vida exaustivamente - em 1894 e em 1901, se não estou em erro - e decerto introduziu algumas mudanças subtis.
Alguém dizia, no início da sua review a este livro, para esquecermos a ideia de um triângulo amoroso. Em “Longe da Multidão”, Thomas Hardy, este arquitecto que escolhe o mundo rural como cenário da sua obra-prima, apresenta-nos Barthsheba Everdene, Gabriel Oak, Francis Troy e William Boldwood. Não acredito que o acaso represente um papel neste romance, pois apesar da tragicidade de algumas passagens, predomina um racionalismo frio, cru, metódico. Tudo acontece sem dar grande espaço a sentimentalismos, e a narração, na terceira pessoa e alternando, por vezes no mesmo capítulo, da perspectiva de uma personagem para as outras, vem sempre revestida de uma tentativa de aligeirar as emoções sob o verniz da razão.
Barthsheba é uma personagem palpável, de tão humana. Observamos o modo como o autor desenvolve a sua personalidade, de uma jovem que respira liberdade, sem bens nem perspectivas, e depois esmagada pela responsabilidade da herança do tio, oprimida pela miríade de possibilidades que a sua nova condição lhe permite. A inovação aqui consiste em termos um autor masculino de uma erudição invejável – e por vezes constrangedora – a escolher um furacão feminino, com as suas convicções e fragilidades, para eixo central do seu romance. Gabriel Oak parece-me o coprotagonista, no sentido em que acaba por ter um parecer ou uma mão quase omnipresente em quase todos os momentos cruciais do enredo.
Apreciei o modo como a jovem Barthsheba apregoa aos quatro ventos que far-se-á respeitar como uma grande proprietária rural, sem ter de se transformar na sombra de um marido inconveniente. Mais tarde, por obrigação, quase se promete em casamento ao vizinho, Mr. Boldwood, depois segue o coração e recusa-se-lhe, apenas para ir recair numa armadilha do mesmo órgão um pouco mais adiante na estrada, ao deixar-se impressionar pela beleza e os modos do sargento Troy. Gabriel assiste a tudo isto, vivenciando-o na condição de primeiro seu pastor e depois seu maioral. É a figura que elimina todos os rumores a respeito da sua senhora, e que nela deposita uma fé apostólica.
Trata-se de uma narrativa prenhe de humanidade, de calculismo e de ingenuidade, num contraste harmonioso entre expectativa e realidade, bater de asas e consequência. Demorei quatro longos meses a lê-lo, por cada citação bíblica, mitológica ou literária que surgia a enriquecer o texto, pelas descrições extensivas e por vezes extenuantes, e pela complexidade das personagens e das suas circunstâncias.
Atribuo 4,5, os 0,5 que faltam para a perfeição devem-se ao facto de o livro não ter despertado em mim uma paixão fulminante. Entendi a Barthsheba e o Oak, bem como as outras duas personagens principais, mas faltou-me a chama que me traz lágrimas aos olhos sempre que me recordo de "E Tudo o Vento Levou" ou de um "O Monte dos Vendavais", tão grotesco quanto magnífico.
Não lhe falta, porém, elevada qualidade literária. Aconselho a quem aprecia histórias de amor e de terra atribuladas. E há sempre aquele sentimento de realização pessoal quando terminamos um livro desafiante... este foi bastante Hard (tinha a piada em mangas desde que li a segunda linha do dito cujo).
Classificação: 4,5****/*