#136 TÓIBÍN, Colm, Brooklyn
Opinião: Nos últimos dias, embrenhei-me em duas histórias queme absorveram a alma, Longe da Multidão (o filme de 2015 inspirado no livro deThomas Hardy), e North and South (a série da BBC de 2004, que de longe foi ahistória que mais mexeu comigo pela complexidade do retrato social e docarácter das personagens principais). Tomei também conhecimento de um filme asair com a Saoirse Ronan, “Brooklyn”, que me pareceu igualmente interessante.Julguei que o livro abordasse os anos cinquenta numa perspectiva de retratosocial. A emigração em larga escala de alguns países europeus para a América,as dificuldades e as realizações que daí adviessem. E, no campo do amor, adifícil escolha entre um italiano amoroso na sua vida nova, ou um irlandêstradicional no país que abandonou.
Aconteceram duas coisasinesperadas com este livro… A primeira é que o li de um sopro, também temapenas cerca de 250 páginas, e ando numa fase pouco produtiva de leitura. Asegunda é que detestei a personagem principal e a condução geral que o autorfez do livro. Nunca se sabe o que a Eilis pensa ou quer, a criatura écompletamente frívola e passiva ao ponto da exasperação. Perdi a conta às vezesque recorreu à procrastinação para evitar confrontos ou que surgiu a frase“pensou em dizer x, mas o melhor era ficar calada”. Tudo se decide ao seu redorsem que ela tenha qualquer parecer nisso: dança com quem a convida, beija quemtenta beijá-la, aceita convites que depois declara não querer ter aceitado,muda de país sem o querer, regressa a casa para lidar com uma mãe que já nãocompreende, debate-se com o dilema de ficar em casa com a mãe que a chamou ouregressar a Brooklyn, onde começara uma nova vida. Nenhuma decisão é baseada noque quer, a moça não tem pulso na sua vida e isso é-me desagradável de ler.Atenção, é verdade que sou apaixonada por anti-heroínas e nem todas aspersonagens principais podem ter o calculismo de uma Scarlett O’Hara, adeterminação cega de uma Cathy Earnshaw ou o brilhantismo de uma LisbethSalander, mas não há um pormenor na Eilis que seja digno de elogio.
Penso que o autor conduziu mal a história. Nãohá um objectivo, só me ocorre a expressão “pointless”. A pesquisa históricaestá feita, os detalhes são interessantes q.b., o retrato de Brooklyn e daIrlanda são pictóricos, não se mergulha nas entranhas de um país e doutro, nosprós e contras de se decidir onde se quer envelhecer, ao lado de quem, fazendoo quê. Faltou profundidade à Eilis, assim como a quase todas as outraspersonagens. Nenhuma se destaca por traços bem marcados excepto, talvez, oapaixonado e leal Tony.
O livro é superficial, light, e por isso mesmodevorei-o com tanta rapidez. Queria muito ter gostado desta obra, mesmo porqueamo a Irlanda e a história do povo irlandês, e aqui estava mesclada com umpassado em comum ao povo italiano, e teria sido tão proveitoso explorar-lhes asnuances… E se a Eilis tivesse dois dedos de testa e tomasse decisões, tudopoderia ter sido tão melhor desenvolvido…
A escrita de Colm Tóibín é simplista, não há umtrecho que valha a pena sublinhar ou uma passagem de marcada profundidade. Anatureza humana é aqui, deste modo, desperdiçada.
Pena, porque quis muito gostar dele…
Deixo também uma nota quanto ao facto de meparecer que a tradução para português peca muito. Li várias passagens que nãome soaram bem, perdi a conta às vezes que li “devia de ser”, e fico sempre nadúvida se é realmente assim que se diz… E “doce”, e “encantadora”, e“maravilhado/fascinado”, etc… Pode ser problema da versão original, ou simplesfalta de criatividade conjunta. É disso que acuso o livro: falta de cor, faltade criatividade para preencher uma tela tão promissora.
Não é dos queaconselho.
Classificação: 2**/****
Sinopse: Numa pequena vila irlandesa dos anos cinquenta, Eilis é uma das muitaspessoas da sua geração que não consegue arranjar trabalho. Quando surge umaoportunidade na América, é-lhe evidente que tem de partir. Jovem, sozinha esaudosa, Eilis começa uma nova vida em Brooklyn e a sua tristeza vai sendogradualmente apaziguada. Quando notícias trágicas a obrigam a regressar àIrlanda, vê-se confrontada com uma escolha terrível: entre o amor e afelicidade na terra a que pertence e as promessas que tem de manter do outrolado do oceano. Uma história de partida e regresso, de amor e perda, da escolhaentre a liberdade pessoal e o dever.